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Casa de Show: Miranda
Nova casa investe em alta tecnologia e conforto para espetáculos da nata da MPB
por Fernando Barros
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23/06/2012
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Inaugurada em março deste ano com a temporada da cantora Gal Costa, a casa de shows Miranda tem uma programação variada que conta com apresentações musicais, teatrais e exposições, entre outros eventos.
Este espaço multicultural, que está abrigado dentro do complexo do Estádio de Remo da Lagoa, no Rio de Janeiro, e que leva a assinatura do arquiteto Carlos Boeschenstein e tem projeto de iluminação de Maneco Quinderé, foi planejada para receber seus clientes com máximo conforto. Além de móveis assinados, luminárias exclusivas e muita tecnologia, a casa conta com estacionamento privativo, oferece de acesso fácil a portadores de necessidades especiais e apresenta um cardápio gastronômico desenvolvido pela chefe Ciça Roxo, do Aguce.
A NATA DA MÚSICA BRASILEIRA
A diretora Ariane Carvalho há algum tempo já procurava um espaço no Rio de Janeiro para montar a sua casa de shows. Esta tarefa não foi nada fácil, devido, principalmente, à localização, na Zona Sul, área nobre da cidade.
Quando surgiu a oportunidade, em 2011, de utilizar o espaço no complexo Lagoon, no antigo Estádio de Remo da Lagoa, ela já tinha uma sócia em mente: Maitê Quartucci. Um ano depois, o aconchegante ambiente da Miranda já estava de pé graças ao arquiteto Carlos Boeschenstein e ao iluminador Maneco Quinderé.
A casa foi inaugurada com uma temporada de duas semanas de Gal Costa. Segundo Maitê Quartucci, diretora artística da Miranda, este era exatamente o objetivo da casa. "Temos trabalhado para resgatar um pouco as temporadas, trazendo o artista para ficar um pouco mais. Em vez de fazer apenas uma ou duas datas, conseguir temporadas maiores."
Neste embalo, cantoras como Adriana Calcanhotto e Alcione também puderam permanecer em temporada de duas semanas, prática corriqueira no show business até os anos 1980, mas que praticamente havia caído em desuso nos últimos anos. "Além disso, temos o projeto Miranda in Bossa, que foi inaugurado com o Marcos Valle e a cantora de jazz americana Stacey Kent. É um projeto de encontros que pretendemos fazer sempre, toda semana, com dois grandes nomes da bossa nova e do jazz", revela Maitê.
Além dos medalhões, o palco da Miranda também receberá bandas da nova geração da MPB, a exemplo do coletivo Sarau. "Aos domingos sempre temos o grupo Samba Social Clube convidando um artista especial. Já passaram por esta feijoada o Fundo de Quintal, Diogo Nogueira, Leandro Sapucaí, entre outros. Às terças, debates com a música sempre como tema central, e quarta-feira o Comédia e Música, com Eduardo Dussek e um comediante convidado", destaca a sócia.
Para Maitê, o perfil de público varia muito em função dos shows. "Cada artista trabalha com um determinado perfil. Eu acho que por ser uma casa intimista, de 225 lugares sentados, nosso público busca, de uma forma geral, mais conforto. É um público que não quer ir para um lugar grande, pegar fila, engarrafamento. Prefere um ambiente mais aconchegante", explica.
ARQUITETURA FOGE DO ÓBVIO SEM PERDER A BRASILIDADE
O detalhado projeto de arquitetura de interiores ficou a cargo de Carlos Boeschenstein. "A Miranda foi instalada utilizando a arquibancada do antigo Estádio de Remo da Lagoa, por isso deixamos caracterizada a arquitetura original com a inclinação da laje", explica o arquiteto.
O processo de criação de Carlos começou com uma profunda pesquisa. "Eu parto sempre do princípio de que existe uma história anterior ao produto que se quer criar. No caso do Miranda, eu parti de um levantamento de toda a época da Carmen Miranda. Não para tematizar o projeto, mas para que eu tivesse referências dela e do estádio de remo. São períodos em que nós nem éramos nascidos", destaca Boeschenstein, cuja experiência no mercado de hotelaria acaba sendo útil em projetos como o da casa de shows.
"Por trabalhar muito com hotelaria, procuro criar ambientes para um publico que não é especificamente homogêneo. Não posso fazer espaços datados ou extremamente autorais", conta. Seguindo este conceito, ele criou um ambiente precioso em detalhes e acabamentos, mas que também acolhe perfeitamente uma feijoada de domingo.
Após a pesquisa, Carlos revela que costuma fazer rascunhos e desenhos à mão, dando as perspectivas dos ângulos mais importantes. "Eu tenho este trabalho de criação manual. Quando o projeto vai para o computador, ele já está quase que totalmente definido como conceito. Muda muito pouco".
O salão conta com 760 metros quadrados, além de cozinha, banheiros, hall e varanda. "Por questões de acústica, este hall funciona com uma antecâmara. E no salão propriamente dito temos uma distribuição de mesas com acentos em níveis diferentes, para pode privilegiar a visibilidade do palco, e dois bares."
Para criar o salão, Carlos preocupou-se bastante em não fazer um projeto demasiadamente temático. "Devido ao nome da casa, em homenagem a Carmen Miranda, poderíamos acabar fazendo referências extremamente tropicais e óbvias. Diferente disso, procuramos fazer do espaço uma área de convivência durante a programação diurna, mas que também recebesse o happy hour e os shows noturnos."
Para isso, ele se propôs a explorar, sobretudo, as janelas e portas que fornecem uma vista privilegiada para a Lagoa e o Corcovado, além de enfatizar a arquitetura original do estádio de remo. "É, inclusive, um prédio emblemático na cidade do Rio de Janeiro", afirma.
A maior lateral, assim como o fundo do palco da casa, é toda envidraçada. "Foi instalada uma segunda esquadria acústica para que mantivéssemos esta ligação com o exterior, mas que não comprometesse a qualidade sonora interna e externa", explica Carlos, acrescentando que o piso aplicado foi todo feito de madeira de demolição, o que, segundo ele, manteve a "cara brasileira" do lugar. Nas paredes foram colocados revestimentos vinílicos americanos. "O teto, além do forro acústico, foi finalizado com tecidos. Existem também luminárias feitas pelo Maneco Quinderé em forma de painéis de aço Corten que acompanham a inclinação da laje."
O aço Corten também está presente em toda a forração dos bares. "Para dar certa sofisticação, todos os tampos dos bares são em mármore italiano Travertino Navona. São mármores beges. Eu pedi para que eles não tivessem brilho. São acetinados. A superfície não é polida em excesso, dando contraste com a iluminação do Maneco".
Carlos explica que, durante o dia, queria que a casa tivesse luminosidade, e diz como a alcançou. "Como fomos muito bem cercados de cuidados acústicos e de sonorização, pudemos colocar cortinas de linho cru em toda a grande janela lateral. É um tecido brasileiro, tropical, que deixa passar muita luz", comenta ele, que optou por tons suaves de verde em outros objetos, como as poltronas.
Na área próxima ao palco, denominado camarote na casa, Carlos usou cadeiras Swan revestidas com camurça importada, ora em ocre liso, ora com estampas de argolas em ocre e turquesa. Por solicitação técnica, a cortina do fundo do palco é feita de um veludo preto, podendo ou não ser utilizado pelo artista.
Dependendo da iluminação, horário e intenção do show, a cortina pode ser aberta, dando vista para a Lagoa Rodrigo de Freitas, ou ser mantida completamente fechada como no caso do show de estreia da casa. "Isto foi discutido em todas as reuniões, e o Maneco, por sua experiência em teatro, foi uma pessoa bem selecionada para este tipo de questão", enfatiza.
Para Carlos Boeschenstein, a casa tem um aspecto informal, mas com uma leitura de acabamento e um requinte sofisticado. "A ideia, no fundo, é ter um ambiente descontraído para um determinado público, mas que tenha também uma leitura sofisticada para shows especiais, uma vez que artistas top compõem a programação da Miranda", pontua ele.
CARMEN
Para a abertura da casa, foi instalada no hall de entrada uma pequena exposição em homenagem à musa inspiradora da Miranda, a própria Carmen. "O hall é todo construído em marcenaria vazada, com vidros de 12 milímetros, como se fosse uma gaiola de madeira. Nesta exposição você encontra o primeiro traje que ela usou em um filme Hollywoodiano", conta Carlos.
O arquiteto acrescenta que a equipe teve o cuidado de selecionar peças emblemáticas do museu Carmen Miranda. "Ela foi para os Estados Unidos nos últimos anos do estilo art déco, então colocamos algumas bijuterias deste período. Além dessas, existem outras feitas com cristais que foram usadas por ela em suas apresentações", informa.
Outra peça com bastante valor histórico é o último sapato que Carmen calçou em cena. "Este sapato é o mesmo que ela usava na véspera da morte dela. Sem planejarmos, acabamos reunindo a primeira roupa dela na América e também uma peça da última apresentação", revela Boeschenstein, referindo-se ao calçado que, em agosto de 1955, Carmen usou durante o programa de TV de Jimmy Durante. Carmen se sentiu mal enquanto fazia o programa, sofrendo, inclusive, um ataque cardíaco que foi confundido com uma ameaça de desmaio. Aparentemente recuperada, recebeu alguns amigos em casa na mesma noite. Na manhã seguinte, foi encontrada morta em seu quarto, encerrando uma brilhante carreira iniciada ainda nos anos 1930.
QUATRO MÃOS
Carlos Boeschenstein considera que a integração entre os projetos de arquitetura e iluminação foi excepcionalmente boa neste caso. "Isto é algo que raramente acontece. A gente procurou trabalhar um com outro não exatamente num conceito de criação, mas dentro do conceito de design. A casa toda teria que ter esta coerência como um produto final. Então, todos os materiais que eu sugeria eu mandava pro Maneco, para que ele criticasse, analisasse e incorporasse ao projeto dele."
O efeito dessa integração de áreas é notado quando se entra no salão principal. "Não fica claro onde termina o projeto de arquitetura e começa o de iluminação. Eles estão absolutamente integrados", comemora Carlos.
O arquiteto fez questão de solicitar a Maneco Quinderé que não se concentrasse apenas no palco. "Por exemplo, temos colunas inclinadas originais do estádio de remo. Eu não permiti que elas fossem usadas com qualquer elemento decorativo, pois são importantes por si só. É um projeto de arquitetura. O que o Maneco fez foi iluminá-las para que elas dialogassem com o espaço", afirma Carlos, para quem o trabalho coletivo ao longo do projeto foi mais valorizado do que as atuações individuais. "O resultado foi um produto extremamente fiel à união da equipe", conclui.
UM "AR" EXCLUSIVO
O aclamado iluminador Maneco Quinderé, que considera o projeto da Miranda um dos melhores trabalhos a quatro mãos dos quais já participou, foi responsável pela criação da estrutura de luz da casa: tanto do salão quanto do palco. "Eu procurei fazer um projeto de iluminação que se integrasse com a lagoa, e, acima de tudo, que fosse calcado no trabalho do arquiteto Carlos Boeschenstein."
Ele revela que a casa tem o mesmo espírito dos antigos Canecão e Jazzmania. "É um estilo mais aconchegante do que o do Citibank Hall ou do Vivo Rio, com um ar mais sofisticado. Por isso a gente optou por fazer uma coisa mais delicada do ponto de vista da iluminação de platéia", destaca Quinderé.
O iluminador explica que, por não ser apenas um teatro, foi preciso tomar cuidado para que o ambiente também comportasse coquetéis, jantares, lançamento de livros e eventos corporativos, entre outros. "Nós tentamos fazer uma luz de restaurante no salão. Não é aquela luz de churrascaria, mas uma luz mais suave."
Com o objetivo de valorizar as janelas e a luz natural, Maneco buscou balancear a luz interna de uma forma que não atrapalhasse a visão de fora. "Trabalhamos muito na qualidade da luz, na dimerização. Nós utilizamos um sistema de dimerização que controla a casa inteira", explica, acrescentando que foram aplicadas lâmpadas dicróicas em todo o salão. "Fizemos umas luminárias em aço Corten com lâmpadas Halopin 25, da Osram, para criar um ar bem exclusivo para a Miranda."
ILUMINAÇÃO DE PALCO BASEADA EM LED TRAZ CONFORTO AO ARTISTA
Para iluminar o palco foram usadas 36 luminárias PAR LED RGBW Hot Machine e 24 elipsoidais, entre 26 e 36 graus, além de um console de controle Avolites Pearl 2010. "Na PAR LED nós temos desde o branco até uma gama enorme de cores. O pé direito é baixo e a tecnologia LED ajuda a não esquentar muito o ambiente, o que é bom para o artista. Não precisávamos de canhões para fazer a movimentação, então optamos por elipsoidais. Este kit básico é suficiente, pois o palco é relativamente pequeno. Caso o artista queira algum outro equipamento ou efeito, ele pode alugar", explica Maneco.
Ele adiciona que a intenção da Miranda também é gravar eventos como o Palco MPB, da MPB FM do Rio de Janeiro. "O som é muito bom e a luz é muito boa também. Isso significa que é um espaço onde você pode, inclusive, realizar gravações de DVD."
Para ele, a casa está tecnologicamente preparada para receber qualquer tipo de show, principalmente apresentações acústicas, de MPB e jazz. "Tudo na casa foi pensado e criado de uma forma exclusiva, desde a luminária da entrada, na forma de uma letra M, até ao palco com lâmpadas de LED. É claro que não dá pra fazer um show do Iron Maiden, mas o ambiente comportou muito bem o novo espetáculo da Gal Costa. Não era um show rock'n'roll, mas também não era exatamente um recital", encerra Maneco.
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