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Revista Luz & Cena
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Adair Daufembach
Marcio Teixeira
Publicado em 01/11/2016 - 00h00

Foto: Julio Cesar Azevedo

O produtor e engenheiro Adair Daufembach Lima ("Carneiro" e "Dadá" para os mais chegados), nasceu há 36 anos em Criciúma, Santa Catarina, e se lembra que seu interesse pela música nasceu junto com seu interesse pela guitarra. E a primeira delas chegou às suas mãos aos 14 anos de idade. "Muito cedo me apaixonei por metal e música instrumental em geral. É muito louco isso, pois lembro que os primeiros CDs que aluguei - sim, na época se alugava CDs - foram '...And Justice For All', do Metallica, e 'Not Of This Earth', do Joe Satriani. Isso foi muito importante porque guitarra é um instrumento que exige conhecimento de harmonia e também porque, para se trabalhar com metal e rock em geral, saber sobre guitarra é fundamental", destaca Adair.

Já o interesse pela produção veio quando ele assistiu ao documentário A Year and a Half in the Life of Metallica, que mostra as gravações do Black Album. "Eu fui o cara que mais alugou aquele VHS na locadora perto da minha casa e gostava muito mais do primeiro vídeo, que falava da produção do disco em estúdio, do que do segundo, que falava do lançamento dele", recorda Adair, mostrando como desde cedo o gosto pelo que acontecia no "laboratório" falava alto. "Eu queria ter uma banda e uma guitarra preta igual à do Kirk, mas hoje enxergo que o que ficou foi a vontade de ser o Bob Rock", completa ele, que em 1996 já realizava gravações em K7 no famoso esquema do duplo deck. "Apesar da precariedade, era 'mágico' me ouvir. Ficava com muito chiado, mas já era um prelúdio para o tanto que eu teria que me virar nessa vida do áudio. Comecei ali a desenvolver meu talento para tirar 'leite de pedra'."

Em Criciúma, no ano de 1998, gravando com a banda Eclipse seu primeiro disco em estúdio, se apaixonou pelo ambiente, descrevendo a experiência como "sensacional". Em 2000, Daufembach começou a gravar na lavanderia da casa de sua mãe, que estava sendo convertida em estúdio, mas também nessa época ele havia passado para o curso de Direito na Universidade Federal de Santa Catarina, em Florianópolis. "São 300 km de distância entre Criciúma e Florianópolis, então basicamente estudava durante a semana, em Floripa e nos fins de semana ia para Criciúma apenas para gravar. O computador em que eu fazia os trabalhos da faculdade era o mesmo em que eu gravava, então todo fim de semana eu pegava o ônibus carregando o gabinete do computador na mão esquerda, a guitarra na direita e nas costas a mochila de roupa suja para a minha mãe lavar. Passar em catracas com isso tudo era um inferno. E assim eu fiz por quatro anos!", conta Adair, revelando parte surreal da sua história. Mas não faltavam motivos para fazer a viagem.

"Havia estúdios em Criciúma, só que nenhum especializado em rock/metal. Então, desde o meu primeiro trabalho, com a banda Agony, a procura pelos meus serviços foi insana. A condição para gravar comigo era 'beleza cara! Posso gravar o seu disco, mas você precisa levar um monitor de computador!'", conta o produtor, que, depois de concluir a faculdade, tinha à sua espera uma lista de bandas querendo gravar. "Nem pensei em trabalhar como advogado. Minha melhor oportunidade profissional era com produção musical mesmo. Imagina se tive alguma dúvida na hora de escolher que caminho seguir..."

Embora não tenha trabalhado em nenhum estúdio que não o seu próprio, Daufembach destaca que uma experiência muito importante no início de sua carreira foi acompanhar, na Alemanha, a mixagem do álbum Infallible, da banda Hangar, ao lado do produtor Tommy Newton, tido por Adair como seu mentor. Foram 15 dias no estúdio, com Newton dedicando bastante tempo diariamente explicando como fazer cada coisa. Sobre os trabalhos que mais se orgulha de ter realizado, Adair afirma que cada disco é sempre um trabalho árduo, demorado e planejado. "Cada disco é um filho. É o maior clichê da Terra, mas é a mais pura verdade", diz o produtor. "Entre os que mudaram a minha vida, um é Tempestade, do John Wayne. Nele há a música Aliança, que fala sobre a união entre estilos de uma forma perfeita. Eles ainda não tinham o disco completo gravado e já lotavam casas de São Paulo por causa dessa música. É o hino do underground, praticamente. Um fenômeno. No lançamento desse disco no Carioca Clube, que teve lotação máxima, algo sem precedentes no estilo, apresentei a entrada da banda, e das cinco que tocaram naquela noite, três foram produzidas por mim", diz Adair, orgulhoso.

Ele também cita o álbum Ciclo Interminável, do Ponto Nulo no Céu. "Esse disco foi um arregaço na cena underground do Brasil. Foi através desse trabalho que meu nome começou a circular em todo o país. A banda chegou com letras incríveis, um senso de administração incrível e eu estava com muito sangue nos olhos de fazer o melhor possível e impossível. Fizemos esse EP com um cuidado indescritível", ressalta ele, que também acrescenta à minilista o álbum Que Seja Feita a Nossa Vontade, do Project46. "Esse disco foi muito bem sucedido e tem um significado muito forte para mim, pois é mais uma prova de que metal pode ser feito em português", afirma Daufembach, que coloca o álbum homônimo da banda Agony como menção honrosa. "Esse foi o meu primeiro disco, gravado lá em Criciúma, na casa da minha mãe e com uma banda formada por grandes amigos meus. Além de muito legal até hoje, sem ele nada teria acontecido na minha vida", conclui.

Sobre a cena metal brasileira sob o prisma da produção, Adair nota clara evolução nos últimos anos, num curto espaço de tempo. "No início dos 2000, se você quisesse ter um disco 'igual ao dos gringos', necessariamente você tinha que sair do país e gravar com um deles. Agora, todos os dias sou marcado no Facebook em posts de produtores do Brasil inteiro, e tem uma galera apavorando geral! É uma pena esse tipo de música ser pouco valorizada no nosso país, pois estamos muito bem servidos de bandas e produtores de metal", observa o produto, deixando claro também que as mentes que fazem metal hoje são muito mais abertas que as mais antigas, sendo hoje comum, segundo ele, encontrar artistas que tocam brutal death metal e têm influências do rap, jazz ou da música pop. "Acho que a internet permitiu, ao músico que começa a tocar, ouvir muito mais coisa diferente do que a galera da minha época. A nova geração do metal permite muito mais influência de estilos ditos 'estranhos' à sua música, e eu acho isso muito bom."

Perguntado sobre o que julga ser necessário para realizar seu trabalho com excelência, Adair afirma que a atenção aos detalhes é essencial, pois tudo é importante. "Se tem uma frase que eu repudio fortemente dentro do estúdio é 'ah, isso, no bolo, vai funcionar'. Não consigo aceitar essa ideia. Pra mim, tudo o que está dentro da música tem que estar perfeito", declara ele, que, quando pensa em planos para o futuro, tem em "evoluir" uma palavra-chave. "Há uma série de coisas novas para a minha vida em 2017, e quem me acompanha nas redes sociais vai saber em breve. Vou fazer mais um estúdio e estou superempolgado com o que está por vir", encerra.


BATE-BOLA

Consoles: Os API

Microfones: Shure SM57

Equipamentos: Meus ouvidos (risos)

Periféricos: LA-610, da Universal Audio. Não consigo me imaginar gravando as vozes de um disco sem ele.

Melhor equipamento que já usou: TK Audio BC1-S. Esse bus compressor mudou a minha vida.

Última grande novidade do mercado: Kemper Profiler. Ainda uso amps de verdade, mas esse equipamento tirou o meu sono quando saiu. Ele é incrível.

Melhores estúdios, dentro e fora do Brasil: One on One, onde foi gravado o Black Album, do Metallica. No Brasil, adoro o The Magic Place, em Florianópolis. Me sinto super bem lá e tem excelentes equipamentos.

Processador: Lexicon 480L

Monitor: Adam A7X. Me fez ouvir o que eu não ouvia, e, ainda por cima, com preço acessível.

Plug-in: Waves RVox. Já deixei de usar os meus 1176 nas vozes de um disco para usar ele.

Melhores produtores: Internacionais - Andy Sneap/Bob Rock/Nacional - Paulo Anhaia

Sonho na profissão: Gravar o Metallica

Sonho já realizado na profissão: Ver uma banda que produzi desde o começo tocar no Rock in Rio. Em dobro ainda, por cima! (John Wayne e Project46)

Dicas para iniciantes: A tecnologia está aí para facilitar. Hoje temos simuladores de tudo, mas você não se tornará um profissional completo se não tiver contato com as coisas reais. Se você não souber afinar, microfonar uma bateria e tirar som dela, sua carreira estará fadada a ir só até a metade do caminho. Mesma coisa com amplificadores e pedais de guitarra.

 
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