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Revista Luz & Cena
Mixagem
Mixagem sem segredos (Parte 6)
Volumes - Decibel
Fábio Henriques
Publicado em 29/11/2015 - 00h00
Agora que já vimos aspectos importantes envolvendo frequências, vamos focar no outro parâmetro fundamental para o áudio - a amplitude, que está intimamente relacionada à nossa sensação de volume ou loudness. Mas, antes de nos aprofundarmos no assunto, vamos encarar o desafio de explicar eficientemente o jeito de quantificar isso tudo: a medida em decibéis.

LOGARITMOS

Eu sei, eu sei. Esse assunto é chato, foi um alívio quando nos livramos dessa matéria em matemática etc., mas que tal dar uma chance pra gente mostrar um jeito diferente de falar nesse assunto? Ok, vamos lá.

Podemos encarar os logaritmos como um jeito de fazer contas com números grandes através de números pequenos. No tempo em que não havia calculadoras eletrônicas, tipo 40 anos atrás, era o jeito que se tinha pra fazer estes cálculos, usando uma ferramenta chamada régua de cálculo (figura 1).


Pra entendermos logaritmos, porém, precisamos lembrar da potenciação. Todo mundo lembra que podemos escrever 100 como 10 x 10 , ou 102. Da mesma forma, o número 1.000 pode ser escrito como 10 x 10 x 10, ou 103. Esta forma compacta de escrever possui uma "base", que é o 10, e um "expoente", que são o 2 e o 3 (os termos "ao quadrado" e "ao cubo" se referem ao jeito de calcular respectivamente a área de um quadrado e o volume de um cubo).

Que tal agora combinarmos um jeito mais compacto ainda de representar esses números, em que vamos apenas citar o expoente? Por exemplo, se dizemos "4", quer dizer que estamos falando na verdade do número 10.000 (que é 104), e se dizemos "5", quer dizer 100.000. Logaritmos são apenas isso.

Ou seja, quando dizemos matematicamente que log10 1.000 = 3 (logaritmo de 1.000 na base 10 é igual a 3), estamos falando justamente o que combinamos acima. Normalmente, quando a base é 10, não precisamos escrever o numerozinho da base, e colocamos apenas "log".

Assim, a utilidade básica dos logaritmos fica bem evidente, pois é muito mais fácil escrever 12 do que 1.000.000.000.000 (segundo Laplace, os logaritmos são "um admirável artifício que, ao reduzir para poucos dias um trabalho de muitos meses, duplica a vida dos astrônomos e poupa-os dos erros e desgostos inseparáveis dos longos cálculos"). Vejamos agora uma propriedade importante dos logaritmos. Pode-se notar que nos exemplos acima o logaritmo pode ser associado com o número de zeros do número original (chamado de "antilogaritmo"). Disso, podemos concluir que o logaritmo de 10 é 1. Além disso, extrapolando mais o raciocínio, dá pra ver que o logaritmo de 1 deve ser 0. Essa propriedade, que leva um tempão pra ser deduzida oficialmente em uma aula de matemática, mas que aqui se torna bem simples de constatar (log 1 = 0), é muito importante, como veremos mais à frente.

Mas até agora só vimos os aspectos mais "simpáticos" dos logaritmos. Quebrado o gelo, vejamos coisas um pouco mais complicadas. Por exemplo, sabemos que o log 10 = 1 e que o log 100 é igual a 2, certo? Mas e o log 20? E o de 59?

Até agora o que podemos afirmar é que o log de qualquer número entre 10 e 100 está entre 1 e 2 , e isso já é alguma coisa. Usando uma calculadora, descobrimos que o log 20 = 1,301 e que log 59 = 1,771 (resultados arredondados).

O mais interessante é que podemos observar que se o log 20 = 1,301, por sua vez o log 200 = 2,301 e o log 2 = 0,301. Essa propriedade torna as coisas muito mais fáceis, porque se sabemos os valores entre cada intervalo de 10 vezes, basta colocar na parte inteira do resultado o número de zeros. O que devemos guardar como valor importante aqui é que podemos dizer que, aproximadamente, log 2 = 0,3.

PARÊNTESES - FACILITANDO MAIS AS CONTAS

Além dos logaritmos facilitarem as contas por usam números menores, ainda apresentam outras vantagens. Por exemplo, se temos que multiplicar dois números, basta somar seus logaritmos. Se temos que dividi-los, basta subtrair os logaritmos. Melhor ainda, se temos que elevar um número à potência n , basta multiplicar o seu log por n, e se temos que extrair a raiz n de um número, basta dividir seu log por n. Imagine numa época em que não havia calculadoras como isso facilitava a vida.


Exemplos:

Log 8 = log (2 x 4) = log 2 + log 4 = 0,301 + 0,602 = 0,903
Log 8 = log (16 / 2) = log 16 - log 2 = 1,204 - 0,301 = 0,903
Log 8 = log (23 ) = 3 log 2 = 3 x 0,301 = 0,903
Log 8 = log (√64) = (log 64) / 2 = 1,806 / 2 = 0, 903

 A MEDIDA EM BELS E DECIBÉIS

Quando falamos em medições em Bels (e seu derivado em decibéis), estamos, na verdade, falando em comparar duas grandezas. A definição original compara duas potências elétricas (mas pode ser estendida a outras grandezas, como veremos) e é definida como o logaritmo da razão entre estas grandezas: PBel = log (Pmedida / Pref)

Ou seja, a potência medida em Bels é o logaritmo da potência medida sobre uma potência de referência. Por exemplo, se admitimos um certo valor como potência de referência e na hora de medir verificamos que o valor medido é o dobro do valor da referência, Pbel = log (2 Pref / Pref) = log 2 = 0,301 = aproximadamente 0,3.

Bom, a gente tem preguiça de ficar trabalhando com vírgulas, então, por comodidade, vamos trabalhar não com o Bel, mas com uma unidade dez vezes menor - o decibel. Assim, a medida em decibéis é dada por PdB = 10 log (Pref / Pref)

No caso de nosso exemplo acima, se a potência medida é o dobro da referência, o valor em dB é 3, o que é bem importante para nós.

Mais um exemplo. Se a potência medida é dez vezes a referência, PdB = 10 log (10 Pref / Pref) = 10 log 10 = 10 x 1 = 10

E se a potência medida é exatamente igual a potência de referência, PdB = 10 log (Pref / Pref) = 10 log 1 = 10 x 0 = 0

Resumindo, vejamos coisas importantes que aprendemos até agora:

- A medida em decibéis compara grandezas do tipo potência.
- A comparação se dá entre uma potência medida e uma referência.
- Se a potência medida é o dobro da referência, a medida é 3 dB.
- Se é dez vezes o valor da referência, a medida é 10 dB.
- Se a medida é igual à referência, o valor medido é 0 dB.

VANTAGENS

Podemos observar que a medida em dB é comparativa. Isso nos dispensa de nos preocupar com os valores das medidas originais. Por exemplo, vejamos o gráfico típico de resposta em frequência da figura 2. No eixo vertical temos "níveis relativos (dB)" e, no horizontal, frequências. Como a medida do nível é relativa (em dB), nós não nos preocupamos em saber que valores foram efetivamente medidos. Como já descobrimos que medir 0 dB significa medir exatamente o ponto de referência, basta olharmos o comportamento da curva em relação ao nível de 0 dB.

Por convenção, em um gráfico desses adotamos o nível obtido em 1 kHz como referência, independentemente do valor medido. Podemos, então, avaliar o comportamento do dispositivo comparativamente entre uma certa frequência e o ponto de 0 dB. Outra vantagem é que podemos representar variações grandes através de números pequenos, fazendo contas mais facilmente.


INTENSIDADE, POTÊNCIA E PRESSÃO SONORA

Potência sonora é a quantidade de energia irradiada por uma fonte sonora, por unidade de tempo, e é medida em watts (W).

Intensidade sonora é a medida do fluxo médio de energia acústica em um campo sonoro. É medida em watts por metro quadrado e é uma quantidade vetorial, já que a energia flui em um determinado sentido.

Nível de intensidade sonora, na medida em que é um valor relacionado à potência, é medido em dB através da nossa conhecida fórmula L1 = 10 log (Imed / I0) dB.

Pressão sonora é a variação local da pressão atmosférica em relação ao ponto de equilíbrio, e é medida em pascals (Pa). Os ouvidos e os microfones são sensíveis à pressão sonora (há casos especiais de microfones sensíveis à velocidade das partículas).

O nível de pressão sonora é a medido em dB comparativa entre a pressão sonora medida e uma pressão de referência. Em áudio e acústica, normalmente se considera esta pressão de referência P0 o valor de 20 µPa (micropascals), que é admitido como o mínimo percebido pelo ouvido humano: L1 = 20 log (Pmed / P0) dBSPL

Neste ponto somos apresentados a um elemento novo na medida em dBs, que é o sufixo. Como é uma medida relativa, é preciso que saibamos qual a referência usada. Esse é o papel do sufixo. Neste caso, SPL (Sound Pressure Level) indica que a pressão de referência foi o mínimo da audição humana (20µPa).


Retornaremos a esse assunto quando falarmos de monitoração, mas adianto que o valor permitido pela legislação brasileira para oito horas de trabalho contínuo é 85 dB (ponderação A, que não leva em conta os graves; na prática de estúdio e com música em vez de ruído, minha experiência demonstra que esse valor pode se equiparar a 95 dB sem ponderação).

ANÁLOGO ELÉTRICO

Até aqui vimos definições referentes ao som como energia acústica. Agora vejamos os seus análogos para os sinais de áudio.

A medida do nível de potência elétrica é análogo à medida do nível de intensidade sonora, e é representado por L1 = 10 log (ωmed / ω0) dB (ω indica potência elétrica). Quando trabalhamos em equipamentos elétricos e eletrônicos, estamos lidando não diretamente com potências, mas com tensões (voltagens), correntes e impedâncias. A potência elétrica pode ser definida como ω = V2 / R (V é a tensão elétrica e R é a impedância).

Substituindo na fórmula em dB, L1 = 10 log ((V2 med /R) / (V20/R)) dB = 10 log (V2 med / V20 )) dB = 20 log (V med/ V0 ) dB

Ou seja, a medida de nível de tensão elétrica é análoga à medida do nível de pressão sonora.

CONCLUSÕES IMPORTANTES

Como sabemos que log 2 = 0,3, podemos concluir que o dobro da potência significa um acréscimo de 3 dB, e que dobrar a tensão significa subir 6 dB.


No Pro Tools, por exemplo (figura 3), o plug-in de ganho mostra que dobrar o nível de pico (colocá-lo em 200%) significa subir 6 dB. Ao mesmo tempo, podemos ver como funciona a lei do pan, que veremos mais adiante. Um sinal que tem pico de -6 dB no canal (Audio 1), quando é colocado por igual nos dois lados do master fader, perde 3 dB, ficando com pico de -9 dB. Isso faz com que o volume audível se mantenha quando se coloca um canal mono em um extremo ou no centro do pan.

Outro dado importante é que dois canais iguais e em fase em mono irão provocar um acréscimo de 3 dB no nível, como se vê na figura 4. Em tese, por exemplo, e dobramos uma voz gravada no mesmo nível, teríamos que compensar diminuindo o volume da soma em 3 dB. Porém, as ondas não são exatamente iguais e não estão totalmente em fase, e na prática o valor não será necessariamente esse, mas pode servir de orientação.

OUTROS SUFIXOS

Ao longo de nosso trabalho em áudio iremos encontrar alguns outros sufixos relativos a medidas em dB. Vejamos exemplos:

- dBm - medida de potência em que a referência é a potência de 1mW (1 miliwatt).
- dBu - medida de tensão em que a referência é 0,775 volts. Pode ser usada independentemente da impedância, mas deriva do fato de que a tensão RMS (média) para uma potência de 1 mW aplicada em uma impedância de 600 ohms é 0,775 V.
- dBV - medida de tensão em que a referência é 1 V. Usada independentemente da impedância.

Os equipamentos profissionais usam um padrão para o ponto de 0VU (volume de referência), o valor de +4 dBu e os equipamentos para o público em geral usam um padrão de -10 dBV. A diferença entre os dois valores, por causa da diferença de tensões de referência, é, na verdade, de 11.79 dB.

Na próxima etapa, seguimos estudando volumes, sua importância e os jeitos de medi-los.

Fábio Henriques é engenheiro eletrônico e de gravação e autor dos Guias de Mixagem 1,2 e 3, lançados pela editora Música & Tecnologia. É responsável pelos produtos da gravadora canção Nova, onde atua como engenheiro de gravação e mixagem e produtor musical. Visite www.facebook.com/guiaDeMixagem, um espaço para comentários e discussões a respeito de mixagens, áudio e música e, para comentar também este artigo.
 
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