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Revista Luz & Cena
Sonorização
Alinhamento de Sistemas
Até onde é possível chegar com um sistema
Alexandre Rabaço
Publicado em 01/09/2002 - 00h00
Muitas vezes, nos deparamos com sistemas de sonorização que se comportam extremamente bem assim que colocamos aquele nosso CD já bem conhecido para tocar, ou então falamos através de um microfone. Mas, algumas vezes, nos deparamos com sistemas que parecem estar com algum problema, seja de resposta de freqüência, de cobertura, de estabilidade e muitos outros. É aí que precisamos conhecer alguns procedimentos básicos (e outros nem tão básicos) para que possamos melhorar o desempenho do sistema em questão.

Antes de tudo, precisamos fazer uma audição crítica do sistema. Assim, poderemos perceber o que está errado, ou melhor, começar a perceber o que não nos agrada no sistema. Enquan-to estamos nesta fase, devemos ter em mente alguns aspectos, tais como:
 Os sonofletores estão distribuídos de forma correta, tendo em vista a necessária cobertu-ra sonora do local?
 O sistema tem condições de reproduzir toda a banda passante desejada ou necessária?
 O sistema tem condições de atingir o nível de pressão sonora (SPL) desejado ou necessá-rio sem distorções ou falhas, dentro de toda a banda passante?
 O sistema tem algum tipo de ruído?
 O sistema apresenta algum tipo de realimentação quando levado ao nível de trabalho, com todos os microfones necessários abertos?
 A configuração do sistema está clara para você?
 Todos os componentes do sistema estão funcionando corretamente?
 Quais ferramentas, tanto de análise quanto de correção, você vai utilizar para facilitar seu trabalho de alinhamento?
 Você tem o tempo necessário para corrigir os problemas porventura existentes?

Note que nenhum tipo de equipamento de análise vai conseguir responder a todas estas questões. Alinhar um sistema de som requer, definitivamente, um par de ouvidos treinados e um profissional que saiba até onde é possível chegar com um sistema, para que não se perca tempo tentando alcançar um objetivo inalcançável com um determinado sistema. Por outro lado, o uso consciente de ferramentas de medição pode abreviar, em muito, o tempo neces-sário para a análise e correção do sistema.

FFT x RTA
Há algum tempo, a utilização de RTAs em conjunto com equalizadores de 1/3 de oitava do-minou a preferência dos técnicos e engenheiros de som na hora de alinhar um sistema. Na verdade, antes do aparecimento dos analisadores FFT com preços acessíveis, essas eram as ferramentas disponíveis. Então os RTAs mostravam a amplitude x freqüência numa resolução de 1/3 de oitava e os equalizadores eram utilizados para "corrigir" a resposta apresentada pelo analisador. Parecia muito simples: bastava mover o slide correspondente do equalizador, até que se obtivesse a resposta desejada na tela do analisador. Infelizmente, os resultados nem sempre agradavam aos ouvidos, apesar de parecer, no analisador, que estava tudo cer-to. Na verdade, os RTAs, apesar de serem sensíveis aos problemas de fase e cancelamentos, em modelos com resoluções maiores do que 1/3 de oitava, não conseguem traduzir as infor-mações para o domínio do tempo; sempre estaremos trabalhando com freqüência x amplitu-de. Sendo assim, nos guiando apenas pelos RTAs, dificilmente conseguiremos perceber quando os problemas são relativos à interação entre caixas; interação entre caixas e ambien-te; posicionamento inadequado de caixas ou problemas de acústica. Além disso, não podemos saber qual a relação entre o sinal recebido pelo microfone do analisador e o sinal entregue aos falantes, ou seja, precisamos utilizar um sinal conhecido (ruído rosa, por exemplo) e, mesmo assim, não teremos certeza de que o sinal está sendo entregue corretamente aos falantes, pois não temos como utilizá-lo como referência em tempo real, uma vez que os RTAs possuem apenas um canal para realizar as medições. E, para piorar ainda mais, a resolução de 1/3 de oitava da maioria dos RTAs é insuficiente para alinhamentos críticos; não há como saber se um "pico" em duas freqüências adjacentes é o que está na tela do RTA, ou se é um imenso pico em uma freqüência intermediária, muito mais estreita. Isto posto, fica mais fácil entender porque um sistema com excelente inteligibilidade e outro com uma inteligibilidade pobre podem exibir respostas bem parecidas, quando não iguais, na tela de um RTA.

Afinal, o que são os analisadores FFT?
FFT é a abreviação, em inglês, de Transformada Rápida de Fourier. A Transformada de Fouri-er é uma ferramenta matemática normalmente utilizada para converter um sinal medido no domínio do tempo (amplitude x tempo) em um sinal no domínio da freqüência (amplitude x freqüência). A FFT foi eficientemente implementada por J.W. Cooley e J.W. Tukey, em 1965. Extensivamente utilizados por John Meyer para medições nos anos 80, os dispositivos de me-dição FFT começaram a se tornar "populares" mais recentemente, com a rápida evolução dos computadores, tendo em vista que a Transformada Rápida de Fourier é uma função matemá-tica algo complexa, necessitando de processadores relativamente rápidos para realização das operações matemáticas. Com analisadores FFT de dois canais, podemos comparar dois sinais em tempo real, utilizando-se um deles como referência para as medições. Os analisadores FFT podem fornecer grande quantidade de informações e, por isso mesmo, precisamos ter em mente como utilizá-las corretamente. Precisamos saber como e onde agir para que te-nhamos, no final de todo o trabalho que é alinhar um sistema, um resultado, se não perfeito, pelo menos muito próximo a isso.
Obviamente, existem salas, ginásios, igrejas, enfim, diversos locais inadequados para um evento que necessite de reforço sonoro e que, devido à sua interação com o sistema de som, prejudique muito o trabalho de alinhamento, impossibilitando ao técnico ou engenheiro res-ponsável pelo trabalho atingir seus objetivos. Infelizmente, alguns destes lugares continuam sendo usados para shows e eventos, prejudicando o trabalho de todos, além de oferecer ao público um evento, digamos, incompleto.

ALINHAMENTO DOS TRANDUTORES
Um procedimento muito importante é o do alinhamento dos diversos transdutores (falantes e drivers) que compõem uma caixa acústica. Na figura 1 temos uma caixa hipotética; ela é composta por três transdutores, sendo um falante de 15", um de 12" e um driver de 2". Di-gamos que o falante de 15" responda de 60Hz até 160Hz; o falante de 12", de 160Hz até 1250Hz e o driver de 1250Hz até 18000Hz. Como podemos ver, cada transdutor é responsável por uma faixa de freqüências. Entretanto, nas freqüências de crossover, cada dois trans-dutores são igualmente responsáveis pela emissão destas. No nosso exemplo, estas freqüên-cias são 160Hz e 1250Hz Por isso, é de extrema importância que os transdutores estejam verticalmente alinhados, ou seja, os diafragmas dos falantes devem estar milimetricamente alinhados, e estes devem estar alinhados com o diafragma do driver. Se isto não ocorrer, a chance de termos cancelamentos nas freqüências de crossover é muito grande. Antigamente, quando eram utilizadas caixas separadas para cada região de freqüências, era comum mo-vermos as caixas para frente e para trás até que os transdutores estivessem perfeitamente alinhados. Atualmente, com utilização de caixas que contém os diversos transdutores neces-sários agrupados, fica impossível aquela prática.


Quando encontramos sistemas onde já estão integrados processadores ou crossovers, ou mesmo em alguns sistemas ou monitores com divisores passivos, o alinhamento dos transdu-tores já está feito. Entretanto, quando estamos usando algum sistema que não seja integra-do, precisamos providenciar estes ajustes. Para isso, precisamos de um crossover que tenha delay ajustável entre bandas.
Basicamente, podemos proceder este alinhamento de três formas. Uma delas consiste em medir a distância física entre os diafragmas. De posse dessas medidas, basta dividi-las pela velocidade do som, para que obtenhamos os tempos de delays que vamos aplicar nos trans-dutores. O transdutor mais afastado da "boca" da caixa não receberá nenhum delay, enquan-to que o mais próximo receberá um tempo maior, para que, assim, os transdutores estejam devidamente alinhados.
Se for possível a utilização de um analisador FFT, podemos utilizar a função "Delay Finder" ou "Delay Locator" para nos auxiliar nesta tarefa. Esta função nos permite encontrar a diferença de tempos de chegada do som emitido por cada um dos transdutores até um microfone, comparados com um sinal de referência, que pode ser música ou ruído rosa. Naturalmente, haverá uma diferença de tempo entre cada um dos transdutores; assim, basta subtrairmos os tempos encontrados para acharmos o tempo de delay a ser aplicado a cada um dos trans-dutores. Veja a figura 2.


A terceira forma envolve a utilização de um analisador, RTA ou FFT. O procedimento é sim-ples. Primeiro, vamos alinhar os transdutores de médias e os de altas: colocamos o microfone de referência bem próximo à caixa, entre os transdutores que vamos alinhar. Alimentamos o sistema com ruído rosa e vamos lentamente aumentando o nível da via de altas, até que apareça uma leitura representativa no analisador; conhecendo-se a freqüência de crossover entre os transdutores (1250Hz no nosso exemplo), vamos localizar tal freqüência na tela do analisador e marcar sua amplitude. Agora, "mutamos" a via de altas, sem alterar nenhum outro parâmetro e vamos abrindo gradativamente a via de médias, até que, na freqüência de crossover, o analisador mostre a mesma amplitude anotada anteriormente na via de altas. Neste ponto, basta "desmutarmos" a via de altas; se os transdutores estiverem perfeitamente alinhados, acontecerá uma soma de amplitudes na freqüência de crossover, de 3 a 6 dB. Se os transdutores não estiverem alinhados, haverá uma diminuição na amplitude, ou até mesmo não haverá alteração alguma. Daí, basta atrasarmos o transdutor que estiver mais próximo do microfone, até que a soma de amplitudes apareça na tela do analisador e, depois disso, repetir todos os passos para os outros pontos de crossover. Observe a seqüência da figura 3. Mas cuidado: se for necessário alterar a regulagem de alguma banda já alinhada anteriormente, será necessário realizar todo o processo novamente, a fim de não perdermos os alinhamentos já efetuados. Por isso, é melhor começarmos pela via que necessita de MENOR atraso, no nosso exemplo, a via de médias.
Utilizando esta forma de alinhamento, temos a certeza de que a interação entre os falantes estará correta, uma vez que estamos utilizando a leitura de amplitude para procedermos ao alinhamento, enquanto nos outros dois procedimentos, estaremos utilizando a medida da dis-tância física entre os transdutores para realizarmos a correção e, procedendo desta forma, podemos deixar de ter a máxima interação entre os falantes por algum problema de fase en-tre os mesmos (ver box Polaridade x Fase na 2ª parte deste artigo).


COBERTURA IDEAL
O próximo passo será verificar se os sonofletores estão dispostos de forma a fornecer cober-tura ideal (ou quase) a todos os pontos necessários, ou seja, onde houver ouvintes, além de não estarem diretamente "apontados" para nenhuma parede ou qualquer coisa que possa causar reflexões desagradáveis. Muitas vezes, algum ponto da platéia poderá estar prejudi-cado. Infelizmente, poucas são as vezes em que conseguimos uma cobertura ideal por toda a platéia. Alguns lugares críticos são aqueles próximos a paredes, pilastras, ou aqueles que estão em uma área de grande interação entre caixas (overlap). Como normalmente não po-demos quebrar paredes ou pilastras, temos que conviver com elas; já a interação destrutiva entre caixas é um fenômeno que devemos evitar ao máximo. O ideal é que apenas uma caixa cubra determinada parcela da platéia, sem que haja overlap com outra caixa. Muitas vezes isso não é possível, pois apenas uma caixa pode não fornecer o SPL necessário, sendo assim obrigatório o uso de mais de uma caixa para cobrir determinado espaço. Conhecer a diretivi-dade das caixas, na banda passante de interesse, além de sua sensibilidade e máximo SPL, pode ser de grande ajuda neste procedimento inicial. Se não temos estes dados, o que temos a fazer é colocar algum programa conhecido, para que possamos avaliar a cobertura e SPL, em toda a banda passante, por todo o local a ser sonorizado. Isso levará algum tempo, pois teremos que andar por todo o local, analisando "de ouvido" os problemas. Quando localizado algum problema, devemos posicionar o microfone de medição naquele ponto, para que o analisador FFT nos ajude a solucioná-lo. Mas é importante que esse procedimento seja feito inicialmente "de ouvido" porque, andando pelo local, poderemos perceber pequenas inconsis-tências de cobertura, overlap de caixas, "hot spots" e outros fenômenos que, dependendo do posicionamento do microfone da ferramenta de análise, poderíamos deixar de notar. Sendo assim, devemos efetuar uma audição criteriosa, nos afastando do P.A., indo em direção a ele, andando paralelamente às caixas, sempre prestando atenção às mudanças de cobertura, resposta de freqüências e alterações de SPL. Com alguma experiência, poderemos perceber locais críticos apenas olhando para o local e posicionamento das caixas. Depois de todo esse exercício (afinal, muitas vezes o local a ser sonorizado pode ser muito grande), vamos ter encontrado uma série de problemas; alguns poderão ser solucionados com uma nova disposi-ção das caixas acústicas, outros precisarão de algum tratamento diferente, como equalização e outras correções eletrônicas e, infelizmente, alguns não terão uma solução prática definitiva, pelo menos em sistemas "de estrada". Em sistemas fixos, podemos ter acesso a algumas soluções que vão envolver tratamentos acústicos e até mesmo reconstruções e redimensio-namento dos locais. Porém, vamos nos ater apenas a soluções possíveis a nível do sistema, porque assim poderemos aplicá-las de forma prática e efetiva. 

COMB FILTERING
O Comb Filtering, ou "efeito pente" é um dos problemas mais comuns encontrados em siste-mas de sonorização. Esse (desagradável) efeito decorre da interação de duas ou mais fontes de irradiação sonora dispostas lado a lado ou separadas, "tocando" o mesmo programa. Ima-gine, digamos, três caixas colocadas lado a lado. Quando estamos de frente para as caixas, ouvimos, principalmente, a caixa que estiver mais próxima de nossos ouvidos; porém, ouvi-remos também as outras caixas, como na figura 4. Só que a distância percorrida pelo som até atingir nossos ouvidos será diferente para cada uma das fontes, causando cancelamentos em determinadas freqüências. Este fenômeno aparecerá nitidamente na tela de um analisador FFT. Por outro lado, quando as coberturas das caixas não se superpõem, cada ouvinte ouve apenas uma caixa de cada vez, como vemos na figura 5, e neste caso não ocorrem can-celamentos nem comb filtering.

No gráfico da figura 6, podemos perceber o "estrago" que um Comb Filter pode causar na inteligibilidade de um sistema de som. Além disso, devemos notar que não podemos corrigir um Comb Filter com equalizadores, mas podemos minimizá-lo posicionando corretamente as caixas acústicas. Ultimamente, as caixas acústicas têm o formato trapezoidal justamente para que possamos posicioná-las com as laterais encostadas, evitando-se assim o overlap entre caixas adjacentes e minimizando o Comb Filter.
Infelizmente, quando utilizamos fontes separadas, como em shows, onde normalmente en-contramos um conjunto de caixas de cada lado do palco, fica muito difícil evitarmos o Comb Filter, uma vez que sempre haverá interação entre os dois conjuntos de caixas, em algum lugar da plateia.


No gráfico da figura 6, podemos perceber o quanto a resposta de freqüência de um sistema é afetada pelo posicionamento do ouvinte em relação às caixas. Note que na linha central entre as caixas não há cancelamentos, uma vez que as distâncias percorridas pelo som das fontes sonoras até o ouvinte são iguais, causando o que podemos chamar de interferência construtiva, tendo em vista que os sinais se somam, causando aumento do SPL. Fora da linha central, em algumas freqüências vamos passar a ter interferência destrutiva, causada pela diferença da distância percorrida pelo som desde as caixas até o ouvinte. Na figura 7, o ouvinte "A" está próximo à linha central, mas já enfrenta grandes problemas de inteligibilidade. Na verdade, o ouvinte "B" percebe menos problemas, uma vez que as freqüências afetadas pelo Comb Filter estão muito próximas, causando a sensação de diminuição do SPL total nas freqüências médias e altas. Além disso, para que o cancelamento seja mais severo, é necessário que as duas fontes sejam percebidas com o mesmo nível. Como podemos perceber na figura 7, o ouvinte "B" estará ouvindo muito mais a fonte da direita. Já o ouvinte "A", que está mais próximo do centro entre as fontes, percebe claramente as interferências destrutivas; perceba no gráfico como são mais pronunciados os cancelamentos que ocorrem na posicão "A".


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