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Revista Luz & Cena
Áudio e Acústica
Ondas Estacionárias
Axiais: um olhar sobre o tipo de onda que acontece entre duas paredes paralelas
Omeid Bürgin
Publicado em 10/04/2013 - 20h02

Olá! Estamos de volta aos artigos da seção Áudio e Acústica, que mostram como podemos construir nosso próprio estúdio! Já tivemos acesso a alguns fundamentos sobre o som e, nos últimos três artigos desta série, vimos como desenhar o layout de uma técnica e de um estúdio, além de também sermos apresentados às suas lógicas bem diferentes. Nesta edição veremos algo bem perto do layout: as ondas estacionárias.

Elas são calculadas junto ao layout porque, como vamos ver a seguir e na próxima edição da coluna, dependem diretamente das proporções das salas. Sendo que o layout da técnica e da sala de captação, como agora os conhecemos, estão de mãos dadas com os cálculos de ondas estacionárias. Não adianta ter um ótimo layout sem ter calculado as ondas estacionárias. Sem esse cálculo, corremos o risco de precisar refazer o projeto do zero!

Mas o que são estas ondas estacionárias? Para entendê-las, temos que dar um passo para trás e revisar rapidamente o que vimos nos primeiros artigos desta série: fase, reforço e cancelamento. Vamos lá!

REVISÃO: FASE, REFORÇO E CANCELAMENTO

Você se lembra de nosso segundo encontro, O que é Som? (na AM&T 242). Naquele artigo, vimos de perto o que é um cancelamento de fase. Se você não se lembra, sugiro voltar e reler aquela edição para refrescar a memória. Vimos que duas fontes diferentes, emitindo um mesmo som ao mesmo tempo, geram uma adição de sinais que é chamado 'em fase'. Vimos também que se tivermos uma caixa de som emitindo um sinal que se reflete na parede próxima e cuja reflexão se junta com o som original, estes dois sinais agora estarão 'fora de fase' entre si. Teremos uma subtração entre os dois sons, o que chamamos de cancelamento. Este fenômeno é conhecido como speaker boundary interference, e deve ser evitado a qualquer custo em uma técnica. Por exemplo, sons mais graves, normalmente de até 500 Hz, contornam a caixa, refletem nas paredes próximas e acabam se juntando com o som direto, mas fora de fase, por causa do atraso temporal e, consequentemente, dificultando a audição correta.

Resumindo, sabemos que estar 'em fase' resulta em reforço. Também sabemos que estar 'fora de fase' resulta em cancelamento. Para entender a formação de uma onda estacionária, o que vimos com os speaker boundary interferences é um ótimo ponto de partida! Observe o gráfico presente na figura 1.


Uma caixa emite um som que, nas frequências graves, se propaga esfericamente em todas as direções. O som alcança, em pouco tempo, as paredes, que o refletem de volta (imagem 3 da Figura 1). O que não dá para ver muito bem é que o som que volta vai se encontrar com o som partindo das caixas. Estes sons vão se cancelar, como no exemplo da Speaker Boundary Interference.

Então, como as ondas estacionárias se diferem? Vamos estudá-las e observar como se formam passo a passo para entendê-las para sempre.

COMO SE FORMAM AS ONDAS ESTACIONÁRIAS?

Imagine o seguinte exemplo: um tubo fechado com uma onda sonora A (vermelho) indo na direção esquerda. Como este som está soando, no mínimo, alguns segundos, ele está se encontrando com o som B (verde), que está voltando, pois já refletiu da parede no final do tubo e foi para a direção oposta. Nesse momento, os sons estão 'em fase' e se somando, representado pela senoide amarela, que é a onda resultante das primeiras duas, a verde e a vermelha. Até aqui tudo bem?

Uns poucos milissegundos depois, a onda vermelha avançou alguns milímetros, se afastando da onda verde, que também se afastou na direção oposta. Olha como o resultado agora muda: neste exemplo, eles estão agora a 45° fora de fase e o som resultante (a onda amarela) diminuiu.

Mais uns milissegundos depois, eles acabam se afastando um do outro o suficiente para estar a 90° fora de fase, com som resultante mais fraco ainda, e vai até estar a 180° fora de fase, quando o som teoricamente se cancelou. Como estamos em um tubo fechado e controlado, dependendo do comprimento do tubo e do comprimento da onda sonora, chegaremos bem próximo ao ponto de não ouvir mais nada desta frequência. Este processo continuará até chegar a 360°, quando o ciclo se repete. Dependendo do tamanho do tubo, a situação se inverte, com a onda vermelha voltando e vice-versa. Deu para visualizar?

Mas o que aconteceu de fato? O que nos interessa agora é como o som resultante se comportou com o tempo. Ele acaba sendo o som resultante das duas ondas viajando em movimentos opostos, e, com o tempo, acaba gerando momento de adição e de cancelamento. Observe, agora, onde isso acontece. Foque em um lugar específico. Você percebeu? Pegue um outro ponto e verifique de novo. Para quem não conseguiu acompanhar o exemplo, coloquei uma animação de uma corda em nosso site: http://tinyurl.com/anima-corda.

Aprendemos como verificar isso visualmente observando ponto por ponto e fazendo a soma dos dois sons, e vimos que é exatamente assim que os dois sons, na mesma frequência, acabam se cancelando e somando. Este som resultante é a nossa onda estacionária, que se chama assim porque acontece em lugares específicos, fixos, referentes ao espaço fechado. Resumindo, uma onda estacionária pode ser entendida desta forma: quando temos paredes paralelas, um som pode refletir e uma frequência pode se sobrepor seguidas vezes num mesmo eixo, mas em sentido oposto, criando sucessivos reforços e cancelamento.

Ufa! Acho que isso foi a parte mais difícil. O resto agora vai ser bem mais tranquilo, prometo! Alô? Você ainda está comigo?

ONDAS ESTACIONÁRIAS E SEUS HARMÔNICOS EM CORPOS DIFERENTES

Esse padrão de gerar uma onda estacionária é o único possível? Há outras maneiras disso acontecer? Agora que vimos como se forma uma onda estacionária em um tubo, vamos ver como isso acontece em corpos diferentes e como se comporta neles.



Imagine a corda de um violão. A corda é presa nos dois lados e quando ela entra em vibração, gera primeiramente um ventre bem no meio da corda e nós nos finais, onde ela esta fixada. Mas logo depois ela se divide em duas, criando dois ventres com o nó exatamente no meio da extensão da corda. Ela se divide em três, em quatro, em cinco partes iguais, e assim por diante. O que é interessante é que ela sempre se divide desta forma e que os sons resultantes têm uma relação bem simples e interessante: a divisão em dois gerou uma oitava, que seria duas vezes a frequência fundamental da corda. A divisão em três gera uma quinta, uma oitava acima e a divisão em quatro gera a segunda oitava acima do som fundamental. O que importa é que a corda tem um som fundamental e harmônicos que têm uma relação matemática bem simples com ele. Esta simplicidade é bem-vinda nos cálculos futuros das ondas estacionárias.

Vamos ver um outro cenário: o som de uma caixa de bateria. Nele, o som vai se comportar parecido com o da corda, mas, no final, será praticamente ao contrário: ele se divide também em dois, em três, em quatro etc. Mas em vez de formar o ventre no meio, acaba gerando-o nas paredes da caixa. E no lugar do ventre, forma-se um nó, que estava nas extremidades na corda. Entendeu onde quero chegar?

Em um espaço fechado, como o tubo ou a caixa, o som se acumula nas paredes e o nó fica exatamente no meio, ao menos na frequência fundamental. E, como vimos, pode-se gerar uma série harmônica igual à corda que observamos. Para quem quer ver uma animação que ajuda na visualização, verifique este link: http://tinyurl.com/ondas-corpos-dif.

A única diferença entre uma corda e uma sala fechada é a localização dos ventres e nós! São todos padrões estacionários. Na sala fechada, ela é praticamente o oposto da corda: onde tem ventre, tem o nó, e vice-versa. Sabendo disso, começa a ficar cada vez mais fácil entender as ondas estacionárias, ao menos os axiais, que vimos até agora, que são as ondas que se formam entre duas superfícies (eu digo superfície em vez de parede porque a onda pode se formar também entre o chão e o teto).



Um último dado importante é que há três tipos de ondas estacionárias: axiais, tangenciais e oblíquas. Neste artigo estamos apenas nos focando nas axiais, que acontecem entre duas paredes paralelas. As tangenciais se formam entre quatro superfícies, e, as oblíquas, entre todas as seis superfícies de uma sala. Mas estes são assuntos ainda não abordados.

COMO ACHAR A FREQUÊNCIA DE UMA ONDA ESTACIONÁRIA AXIAL?

Como vimos agora, as frequências de ondas estacionárias são extremamente baixas. Elas se encontram entre 20 Hz e 200 Hz. Abaixo de 20 Hz é difícil ter uma onda estacionária, porque terá que ser uma sala muito grande e normalmente as caixas não terão a energia suficiente para formá-las. No outro lado do espectro, ultrapassando os 200 Hz temos muitas ondas estacionárias se formando, que são harmônicos da fundamental. Mas nessa região têm vários outros fenômenos acústicos se somando a isso, dispensando calcular acima dessa frequência de corte. Por isso, geralmente não calculamos mais do que quatro harmônicos. A frequência exata deste corte depende do volume da sala e pode ser calculada, usando uma fórmula.

Eu sempre ensino o seguinte lembrete: até uns 200 Hz, você esta na região das ondas estacionárias e terá que aprender como contorná-las. Até uns 500 Hz, você está na zona dos Speaker Boundary Interference e terá que saber como tratá-los. Acima dos 500 Hz, vamos entrar na área das reflexões, que já vimos no passado, quando fizemos o Ray Tracing para criar a Reflection Free Zone. De qualquer forma, são pontos de referência para ajudar a sua memorização. Ok?

A região que as ondas estacionárias vão afetar é a dos instrumentos que têm conteúdo muito grave, como bumbo, surdo, baixo etc. E como já vimos no passado, se estamos em uma técnica, mixando com uma coloração muito forte, o técnico vai ouvir o som do baixo embolado e muitas vezes vai recompensar na equalização, criando um outro problema. Saber qual é a frequência do problema pode ajudar muito a evitar decisões erradas de mix.

O cálculo da frequência fundamental de uma onda estacionária axial é tão simples quanto o cálculo da frequência de uma onda em espaço aberto, como vimos no primeiro artigo desta série. Vamos comparar as duas fórmulas:


Em que frequência a somatória dessas ondas irá estacionar? A resposta: aquela cujo comprimento de onda seja o dobro da distância entre paredes.

Vamos ver isso na prática? Imagine uma sala de 5 m x 4 m x 2,5 m. Vamos calcular a primeira dimensão de 5 metros. Qual seria a frequência da onda estacionária? Seria 344 m/s ÷ 2 x 5 m = 34,4 Hz, correto? Sabendo que temos os harmônicos desta frequência, podemos multiplicar para obter o mínimo de quatro harmônicos:

f 1 (fundamental) = 34,4 Hz
f 2 (segundo harmônico) = 68,8 Hz
f 3 (terceiro harmônico) = 103,2 Hz
f 4 (quarto harmônico) = 137,6 Hz



Uma vez calculado, sugiro pegar uma folha quadriculada para traçar o seu resultado. Se não tiver, você pode imprimir uma, fazendo uma busca simples na internet. Coloque os resultados em proporção na folha, sendo que a distância entre o f1 e f2 deverá ser a mesma entre f2 e f4.

Calculamos apenas a frequência da onda estacionária axial em uma dimensão, o comprimento da sala. E as outras duas dimensões? Deveríamos fazer o mesmo cálculo para eles e fazer a plotagem na folha também. Terminado isso, você deverá juntar todos eles em um único gráfico e verificar as distâncias entre si. O que importa no final é o seguinte: os resultados dos primeiros harmônicos do cálculo, os axiais, não deverão coincidir - o seu resultado deve ser o mais distribuído possível.

Quanto mais juntos eles ficam, mais você tem um aumento nessa frequência. Você viu as coincidências em 68,8 e 137,6 Hz? Nestas frequências haverá um embolo que afetará a sua audição negativamente.

Seria o equivalente, na equalização de uma música, ao seguinte: se você aumenta duas frequências próximas, você tem um aumento geral nesta região, mas se você aumenta em lugares mais afastados, o resultado acaba ficando mais equilibrado ou flat. Por exemplo, é comum, quando você quer aumentar o baixo, aumentar uma frequência dele, por exemplo, em 80 Hz e depois a sua oitava, 160 Hz, e não 80 Hz e logo 85 Hz. Assim, você evita que o resultado embole. Com ondas estacionárias, é igual! O que procuramos, então, são salas com proporções que favoreçam a distribuição das ondas estacionárias.

Ok: aqui vimos em detalhe as ondas estacionárias axiais, que se formam entre duas superfícies. No próximo artigo vamos ver como as ondas estacionárias podem ser calculadas mais precisamente, incluindo as tangenciais e oblíquas. Vamos estudar quais são as melhores proporções para a sua sala e o que isso significa na prática. Afinal, é isso que sempre procurávamos, não é? Uma sala bastante transparente, que não vai colorir o som que estamos escutando ou gravando. Vamos aprender como evitar estas ondas estacionárias ou, em último caso, como tratá-las com Bass Traps.

Até o próximo artigo!

Omid Bürgin é compositor, projetista acústico e produtor musical.
Fundou a Academia de Áudio (www.academiadeaudio.com.br), que oferece cursos de áudio, produção, composição e music business e dispõe de estúdios para gravação, mixagem e masterização.
e-mail: omid@omid.com.br.
 
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