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Revista Luz & Cena
Técnicas de Estúdio
Equalização corretiva
Utilizando EQs para consertar problemas e dar definição à sua mix
Alexandre Cegalla
Publicado em 17/01/2013 - 10h23
Idealmente, devemos sempre procurar obter o melhor som possível já na gravação de um instrumento, seja pela afinação, ajuste dos controles do amplificador ou posicionamento do microfone. Aliás, a posição do microfone, por si só, já é uma forma de equalizar um instrumento, além de capturar mais ou menos ambiência, dependendo da distância em relação à fonte sonora. Porém, por mais que um instrumento ou vocal soem maravilhosos na gravação e sejam, de fato, bem gravados, na hora da mixagem, com todas as trilhas tocando simultaneamente, pode acontecer de vários instrumentos soarem embolados numa determinada frequência. Por exemplo, o baixo pode embolar com as notas mais graves de um piano, ou uma guitarra e um bumbo soarem com excesso de médios graves, principalmente entre 250 Hz e 500 Hz, perdendo definição. Ou seja, vários instrumentos tocando juntos vão reproduzir certas frequências em comum, e esse acúmulo pode acabar com a clareza da música.

Nesse tipo de situação, costuma ser bem melhor cortar do que aumentar frequências. Muitos engenheiros de som novatos tendem a aumentar os agudos em vez de cortar ou diminuir os graves de instrumentos que soam embolados. Muitas vezes, usar um filtro de high-pass (também chamado "low-cut", pois é a mesma coisa) por volta de 100 Hz pode ser a solução. Esse tipo de equalização, de que falamos muitas vezes, é subtrativa, ou seja, corta frequências indesejáveis ou que estão sobrando. Ela "limpa" a mix e define os instrumentos. Em outros casos, um aumento de decibéis em uma determinada frequência também pode compensar certas carências timbrais. Nas edições anteriores desta coluna abordamos bastante a equalização usada para fins mais criativos, além de comparar equalizadores em hardware com suas emulações em versão plug-in. Desta vez vamos falar do aspecto mais "cirúrgico" da equalização.

ESCULPINDO O TIMBRE DO BUMBO

Seu bumbo e seus toms soam como se fossem "caixas de papelão"? Sua caixa soa tosca e crua? Experimente reduzir alguns dBs entre 250 Hz e 400 Hz no bumbo e nos toms, além de usar um high-pass para remover ressonâncias nos subgraves. E foi exatamente isso que fizemos no bumbo de uma batera gravado em nosso estúdio (studiobunker.com.br). Primeiro, o bumbo sem equalização, no exemplo 1 (a versão "bumbo_sem-eq" pode ser conferida emhttp://tinyurl.com/bumbo-sem-eq). O kick soa "fofo" demais e um tanto apagado.

Sem precisar recorrer ao aumento de volume (a compressão está presente nas versões com e sem equalização), usamos a equalização para enfatizar o "clique" do bumbo e o seu ataque (aplicando um generoso aumento de 9.5 dB em 5 kHz), aumentar o peso (ganho de 6.5 dB em 80 Hz) e remover aquele "som de caixa de papelão" ao qual nos referimos anteriormente (corte de 7 dB em 350 Hz). Além disso, removemos os subgraves abaixo de 50 Hz por meio de um filtro de high-pass (18 dB por oitava). A diferença para a versão "bumbo_eq" (ouça em http://tinyurl.com/bumbo-equa) é nítida, principalmente no tocante à definição do bumbo, que agora também soa bem mais presente e pulsante.



TIRANDO O "BOING" DA CAIXA

No caso da caixa (exemplo 2), a mudança da versão não equalizada para a que tem equalização foi ainda mais extrema. O som original da caixa apresentava um excesso de harmônicos (aquele "boing" na caixa que você escuta em "caixa_sem-eq" - confira em http://tinyurl.com/caixa-sem-eq), que chegam a soar irritantes de tão altos. Lembramos que há bateristas que gostam de muitos harmônicos e tocam dando rimshots (quando a baqueta bate no aro de ferro e na pele da caixa ao mesmo tempo, produzindo um som mais metálico), porém, nesse caso, a coisa extrapolou e o baterista parece que está tocando num latão de lixo!

Não foi o caso nessa produção, mas em situações em que o baterista ou você mesmo, como engenheiro de som, não afinou corretamente a bateria, esses "boings" podem soar ainda mais desagradáveis. De qualquer forma, usamos equalização corretiva em nossa mixagem, removendo 24 dB em 335 Hz, 550 Hz e em 1100 Hz, com um Q alto. Esta largura bem estreita de frequência é ideal para esse tipo mais "cirúrgico" de equalização, pois os cortes só irão afetar estritamente aquelas áreas de frequências problemáticas.

Também reduzimos 20.5 dB em 670 Hz, usamos um filtro shelving em 7.2 kHz para aumentar em 5 dB o brilho de caixa e trazer um pouco mais à tona a esteira (não foi usado microfone na esteira da caixa) e outro shelving em 134 Hz, com ganho de 4 dB, para dar mais peso. Finalmente, removemos os subgraves com um filtro de high pass em 44 Hz (24 dB por oitava). O resultado você confere na versão "caixa_eq" (http://tinyurl.com/caixa-equa). A caixa continua soando com harmônicos, mas de uma forma mais equilibrada e definida, sem parecer um latão nem soar desafinada. Até o volume aparente da caixa parece estar mais baixo, e ela se assenta melhor no kit de bateria.



O macete para achar em quais frequências estão os harmônicos desagradáveis numa caixa é elevar ao máximo (24 dB no EQ do Logic) o filtro paramétrico, usando um Q alto, como já dissemos. O som da caixa provavelmente vai ficar horrível e distorcido, portanto, não se preocupe. Em seguida, busque a tal frequência desejada movendo o filtro paramétrico para cima ou para baixo até encontrar um ponto onde o harmônico parece soar especialmente irritante ou estridente. Reduza agora o filtro paramétrico em quantos dB forem necessários para reduzir ou eliminar completamente o "boing" irritante. Naturalmente, seus ouvidos irão lhe guiar nesse processo, o que acaba se tornando um ótimo treinamento para eles. Engenheiros de som que também são músicos de instrumentos de cordas costumam levar uma certa vantagem nesse tipo de situação, pois seus ouvidos identificam com maior facilidade as frequências indesejáveis.

ENCORPANDO O BAIXO

Assim como os demais instrumentos, o baixo também costuma apresentar certas frequências em que é comum cortar ou aumentar dB, dependendo do tipo de som que se deseja obter. Por exemplo, a região entre 3 kHz e 6 kHz é importante para a presença, enquanto que um aumento na frequência da nota mais grave do seu baixo (vai depender da sua afinação: em um baixo afinado em mi, por exemplo, a frequência do bordão é de 41 Hz) pode dar mais peso e preenchimento ao instrumento. Remover os médios entre 400 Hz e 750 Hz também pode deixá-lo com mais definição. Muitas vezes, quando você mixar um baixo mal gravado e mal timbrado, ele irá soar embolado ou muito abafado. No exemplo 3, entretanto, acontece o contrário: o baixo soa agudo demais, sem peso e muito estridente (versão "baixo_sem-eq" em http://tinyurl.com/baixo-sem-equa). Aumentamos, então, 4 dB em 100 Hz para encorpá-lo, cortamos 4 dB em 158 Hz e 1.5 dB em 500 Hz para aumentar a definição, damos um ganho de 7.5 dB em 1280 Hz para aumentar a agressividade (afinal, é um baixo de rock'n'roll!) e cortamos 10 dB em torno de 3 kHz para reduzir o excesso de estridência. Por fim, usamos o filtro de high-pass em 40 Hz (18 dB por oitava). Na versão "baixo_eq" (ouça em http://tinyurl.com/baixo-equa) ele soa bem mais cheio, articulado e menos agudo.



GUITARRAS COM DEFINIÇÃO

No exemplo 4, a guitarra de metal está embolada e com médios em excesso (versão "guitarra_sem-eq" em http://tinyurl.com/guitarra-sem-eq). Usamos um equalizador com um filtro de high-pass em 90 Hz a fim de liberar espaço para o baixo na mix. A ideia é deixar que instrumentos mais graves, como o bumbo, o baixo e a percussão, tenham destaque abaixo de 100 Hz, enquanto a guitarra se ocupa mais dos médios, o que evita o acúmulo de graves e não deixa que o som fique embolado. Em seguida, reduzimos 4 dB em 350 Hz e 5 dB em 700 Hz, para dar mais definição ao instrumento. Demos um leve ganho de 1 dB em 1600 Hz para aumentar um pouco o punch, e, finalmente, usamos um filtro de low pass em 15 kHz para remover o excesso de estridência nos agudos que amplificadores de guitarra distorcidos costumam produzir.

É interessar observar que guitarras com distorção costumam ficar numa faixa de frequência mais restrita. Normalmente, você vai querer remover qualquer coisa abaixo de 90 Hz a 100 Hz (não se preocupe se a guitarra soar magra quando tocada em solo, pois o baixo é quem vai dar o peso), e vai também cortar ou pelo menos reduzir as frequências mais agudas, acima de 10 kHz a 12 kHz (às vezes, até mais baixo, dependendo do timbre desejado). Escute o resultado na versão "guitarra_eq" (em http://tinyurl.com/guitarra-equa) e confira como a guitarra agora ficou mais definida e as notas soam mais inteligíveis.



SOLUÇÃO DE PROBLEMAS

Como dissemos antes, os diferentes instrumentos de uma banda ou orquestra quase sempre possuem várias regiões de frequência em comum. Por esta razão, mesmo quando um instrumento é bem timbrado, bem gravado e soa ótimo em solo, ao ser tocado com o resto da banda, o som geral pode não sair satisfatório por haver um acúmulo de frequências. A equalização, neste caso, define o som e separa os instrumentos, fazendo com que cada um cubra mais uma determinada faixa. No caso do vocal, porém, isso já não ocorre tanto, pois ele cobre quase todo o espectro de frequência. Mas, mesmo assim, há certas áreas onde podemos trabalhá-lo, como em torno de 4 kHz, para dar mais presença, ou em 250 Hz, para dar mais corpo. Ainda falando dos vocais, geralmente os graves abaixo de 80 Hz a 90 Hz são descartados com um filtro de high-pass, para evitar que o seu som embole.

Problemas de execução por parte dos músicos também podem ser corrigidos com equalização. Por exemplo, numa guitarra em que a palheta às vezes bate de um jeito na corda, que acaba gerando certos harmônicos indesejáveis. Usar um filtro paramétrico com Q alto, da maneira como ensinamos na parte deste texto em que falamos sobre os harmônicos indesejados da caixa de bateria, pode ser a solução para o problema. Ou, quem sabe, um violino que soa muito estridente pode ser melhorado usando-se um filtro shelving ou um low pass. Seja qual for a situação, o equalizador costuma ser uma poderosa ferramenta para resolver problemas relacionados a frequências em sua mixagem.

Alexandre P. Cegalla atua como engenheiro de som há mais de dez anos e já produziu artistas no Brasil e no exterior. É proprietário do Studio Bunker, em Curitiba
(www.studiobunker.com.br)
 
Conteúdo aberto a todos os leitores.