Lugar da Verdade
Qual é o melhor microfone?
Enrico De Paoli
Publicado em 05/01/2013 - 09h46
Há anos se fala em pré-amps. Eles viraram os xodós dos estúdios, donos e fãs. Antes deles, a primeira pergunta que alguém fazia sobre um determinado estúdio era "que mesa tem lá?". Sim, eu adoro pré-amps clássicos, mas não acho que eles sejam os elos mais fortes de uma gravação ou sonorização. Acho que o melhor investimento em um estúdio está na acústica, e, junto com ela, a monitoração. Se você não ouve bem no estúdio, não tem como fazer nada bem. O motivo é simples: sua referência passa a ser nenhuma. O melhor que você conhece é o melhor que você já ouviu.
A todos os grandes fãs de pré-amps (e eu repito: sou um deles!), sugiro um teste: experimente gravar uma voz com dois prés diferentes e um mesmo microfone. Depois, tente gravar uma voz alternando entre dois microfones, sem mudar o pré-amp. Quer que eu adiante o resultado? O microfone muda muito mais o timbre do que o pré-amp. Mas é importante notar duas coisas em relação aos prés: eles têm, sim, um papel importante. O ganho que sai de um microfone é baixíssimo, e a quantidade de amplificação que o pré-amp tem que exercer para elevar este ganho ao nível de linha é enorme. E cada pré-amp faz esta enorme ampliação do ganho com efeitos colaterais variados, causando, assim, uma textura diferente no som. E tem mais uma coisinha. A impedância no estágio de entrada do pré-amp altera diretamente como será o comportamento do microfone.
Logo, sim, um mesmo microfone pode soar diferente de pré para pré, além de também existirem diferenças sônicas inerentes ao circuito do pré-amp em si (e do próprio microfone). Então, é comum vermos engenheiros e produtores tendo combos de prés/mics favoritos para determinada aplicação.
Além de existirem prés e mics conhecidamente bons para algumas aplicações, como, por exemplo, o Shure SM57 com um pré API na caixa da bateria, ou um Neumann TLM103 ou U87 com um pré NEVE 1272 (1073) em uma voz, a escolha dos microfones também pode variar de acordo não só com o que se vai gravar, mas com o espaço sônico que existe para ser preenchido em uma base. Por exemplo, se o engenheiro está gravando uma base toda mais fechada em brilho e o produtor sugere que o percussionista faça um take com um egg (ovinho), a escolha de um AKG C451 pode captar um timbre tão agudo que encaixá-lo na base mais veladinha pode não soar tão musical. Neste caso, escolher uma combinação pré-amp e microfone mais aveludado pode ser mais indicado.
Outra situação clássica, claro, é em gravação de voz. Só se fala em Neumann e Neve pra lá e pra cá. Estes geram timbres nada brilhantes e muito encorpados em médios e graves, com transientes lentos e pouca transparência. Usar este kit pode ser muito bom quando se precisa gravar uma voz magra, normalmente feminina, ou masculina em falseto (com emissão gerada apenas pela garganta, e não pelo diafragma). Neste caso, o tamanho do som Neve/Neumann ajuda a dar mais corpo a estes tipos de vozes. Porém, se a gravação é de um cantor com voz naturalmente grande, gorda, e a base pede uma voz com mais brilho, esta opção é quase certa de não dar o melhor resultado. Neste caso, um Manley Voxbox pode ser uma bela solução, junto com um microfone mais duro... Um AKG C414 ou mesmo um microfone Manley. Notem uma coisa: o Voxbox, apesar de ter este nome, também não funciona para todos os tipos de vozes! Ele tem o som completamente transparente. Logo, se a sua música pede algo mais gordo, outras opções são bem-vindas. Neste caso, use o Voxbox para o contrabaixo. Não tem problema algum você o fazer!
Ainda existe mais uma questão pouco falada. Quando gravamos instrumentos simultâneos, captações com vários microfones ou, ainda, microfonações de palcos ao vivo, além do tipo de captação de um determinado microfone, é importantíssimo conhecer a qualidade da sua rejeição! Ou seja, o quanto este microfone deixa de captar sons indesejados. No caso de uma microfonação de bateria, além do tipo de timbre, digamos, que um microfone capta no tom-tom, é necessário saber quão boa é a rejeição da caixa e pratos, por exemplo. Já quando se usa um microfone na caixa, além dele captá-la com um timbre do gosto do engenheiro e produtor, é igualmente importante a qualidade da rejeição do hi-hat nesta captação. E ao vivo, provavelmente em um show cantado, o microfone mais importante é o do cantor.
Claro que queremos um microfone adequado para a sua voz, porém a escolha é bem diferente de quando selecionamos um mic em estúdio. Ao vivo, precisamos de um bom timbre para a voz daquele cantor ou cantora em todas as músicas, e que combine com a intensidade do show e do público! Já mixei alguns bons shows ao vivo em que o público era tão alto e animado que, quando o cantor emitia pouco, em músicas de registro mais baixo, o microfone captava mais público, palco e ambiente do que a própria voz dele. E isso talvez seja o problema mais difícil de ser resolvido durante uma mix de show ao vivo.
Se tudo o que eu falei não fizer tanto sentido pra você, não tem o menor problema: a escolha de microfone é completamente pessoal e você pode descobrir combinações sensacionais que eu ainda não ouvi. Acredite nelas, e até mês que vem!
Enrico De Paoli é engenheiro de música. Grava, mixa e masteriza em seu Incrível Mundo Studio e em outros cantos do planeta. Projetos recentes incluem a campanha mundial da Smirnoff Crazy Nights, mixada por ele em NY e masterizada no Rio, e shows com a cantora Ana Carolina. Site: www.EnricoDePaoli