Editorial
Muito nem sempre é tudo
Miguel Ratton
Publicado em 04/09/2011 - 10h54
Vivemos numa era de verdadeira abundância tecnológica. Há uma imensa quantidade de aparelhos, softwares e soluções para uma enorme quantidade de aplicações, algumas das quais nem sabemos bem para que servem. O telefone celular, por exemplo, deixou de ser telefone e se tornou um conjunto de recursos que mais parece o cinto de utilidades do Batman. O problema é conhecer tudo o que ele tem e aprender a usar todas essas facilidades, que nem sempre são assim tão fáceis de usar!
Minha assinatura de TV a cabo é bem básica, mas mesmo assim deve ter mais de 50 canais. São tantas opções que às vezes levo um tempo enorme à procura de algo para assistir e acabo não conseguindo assistir nada direito. Só frações de programas, filmes e documentários. Acho que já vi mais filmes pela metade do que inteiros.
Um dos meus primeiros sintetizadores foi um DX7, que só tinha 32 programas na memória interna. Mesmo depois de reprogramar os timbres do jeito que eu queria, eram só 32. O limite era a capacidade de memória do instrumento e eu tinha que me virar com o pouco que tinha (na verdade, naquela época eu até achava que era muito).
Hoje, a dificuldade é exatamente o contrário. Os sintetizadores modernos têm capacidade para armazenar centenas e até milhares de timbres em sua memória interna. E se forem sintetizadores virtuais, o limite é a capacidade do HD do computador, ou seja, praticamente infinito. O mesmo acontece nos recursos e plug-ins de processamento dos softwares de produção e gravação: são tantos que a escolha de qual usar em cada situação vai ficando cada vez mais complicada.
O fato de termos muitas alternativas, que deveria ser uma vantagem, acaba tornando o processo de criação mais difícil, porque a cada vez que experimentamos mais uma opção é um pouco mais de tempo que perdemos, distanciando-nos do objetivo inicial.
No meu caso, o que procuro fazer é manter sempre uma estrutura de trabalho essencial, usando primeiro aqueles recursos que já conheço, gosto e confio, e que sei que são suficientes para atingir meu objetivo. Mas sempre reservo uma parcela do meu tempo para experimentar algo novo. Gosto de pesquisar novidades na internet, mas tomo muito cuidado para não adicionar plug-ins e outros recursos dos quais sei que não vou precisar. Se é bom, acaba substituindo um antigo; se não é bom, desinstalo logo; se é igual ao que já tenho, desinstalo e deixo guardado numa pasta, para usar caso seja preciso.
Se eu tivesse que aplicar um reverb e houvesse uma lista com centenas de plug-ins para escolher, acho que passaria o dia inteiro tentando perceber as sutis diferenças entre eles. Certamente não seria produtivo, pois acabaria cortando a inspiração e estragando o fluxo criativo. A verdade é que não precisamos de muita coisa para fazer a maior parte do que fazemos.
Miguel Ratton