
De 15 a 19 de janeiro, o veterano Elton John esteve no Brasil para apresentar seus sucessos de mais de 40 anos de carreira em três shows - os dois últimos abertíssimos, no Anhembi (São Paulo) e na Apoteose (Rio), e um apenas para convidados, na Sala São Paulo, reduto de música erudita no centro paulistano. Mas para quem não foi selecionado nesta sessão vip, nada de inveja: projetado para apresentações acústicas, o espaço acabou sendo um fator de complicação, e a mixagem ficou um tanto confusa. Coisa que não aconteceu na Apoteose, por exemplo, onde o áudio foi elogiadíssimo, raridade em se tratando do espaço carioca.
Esta e outras curiosidades envolvendo os shows do compositor e cantor inglês no Brasil quem conta é Peter Racy, engenheiro de som da Gabisom, mais uma vez a locadora escolhida para atender aos pedidos da produção do show internacional. Foi a empresa paulistana que forneceu o sistema de PA completo para os três shows (Sala São Paulo, Anhembi e Apoteose), incluindo as duas mesas (PA e monitor) para o cantor James Blunt, que abriu os shows nas apresentações abertas ao público em geral.
A Gabi também foi responsável por fornecer o sistema de monitoração de James Blunt, que contou com caixas L-Acoustics 11FM. Já a monitoração de Elton John veio com a equipe internacional. De acordo com Peter, toda a banda usa sistema in-ear, com exceção do próprio Elton, que deixa a tradição falar mais alto (literalmente) com duas caixas Clair 12AM para a voz e duas Clair 212 com a banda - formada por Davey Johnstone (guitarra e vocal), Guy Babylon (teclado), Bob Birch (baixo e vocal), John Mahon (percussão e vocal) e Nigel Olsson (bateria e vocal).
MONITOR ROCK 'N' ROLL

Como o próprio engenheiro de monitor do cantor explicou, em uma entrevista ao site da Yamaha - que fabrica o piano e as mesas usadas nos shows - Elton John gosta de uma mixagem completa para a monitoração. "Ele quer que soe com um disco", afirmou Alan Richardson, explicando que ele gosta de ouvir os tons, os overheads, cada detalhe da percussão. "Basicamente, eu crio uma mixagem de estúdio completa para ele todas as noites, incorporando quase todos os microfones que há no palco", disse o técnico, que trabalha com o compositor inglês há quase 15 anos.
Além disso, Richardson diz que Elton John gosta de ouvir o show bem alto, nos monitores de chão. Ele conta que a equipe tentou usar sistemas in-ear com ele alguns anos atrás, mas não deu certo. "Ele disse que, apesar de o som nos in-ear ser ótimo, não era rock 'n' roll. Ele é um cara tradicional do rock 'n' roll, que gosta de sentir as pernas de suas calças tremularem", brincou o engenheiro, na entrevista.
Com toda parte de monitoração trazida de casa, a única exigência de fato que a produção de Elton John fez para a equipe brasileira foi que o PA fosse V-Dosc, da francesa L-Acoustics, "em quantidade e configuração compatíveis com as necessidades de cada local", conforme conta Peter. Isso quis dizer, no caso da Apoteose e do Anhembi, um sistema de line array com 28 V-Dosc (14 por lado) e graves fornecidos por 40 SB1000, da EAW (20 em cada lado), além de um front fill feito com quatro V-Dosc, e mais 16 V-Dosc para o delay, com oito caixas em cada lado da arquibancada.

Para a Sala São Paulo, que tem capacidade para 1388 pessoas, foi usado um sistema mais compacto, com 24 dV-Dosc (12 por lado), oito dV-Sub (quatro por lado) e quatro UPM, da Meyer Sound, para o front fill.
Nos três locais, o processamento ficou por conta do Lake Contour e a amplificação foi feita pelo modelo da Lab.Gruppen LA48. O sistema foi alinhado usando-se o software Smaart para acertar os tempos entre os diversos subsistemas (PA, subs, front fill e delay). De acordo com Peter Racy, o ajuste dos níveis relativos entre cada subsistema foi feito com o auxílio do controlador remoto do Dolby Lake, "que permite que o ajuste seja feito estando-se na própria zona que está sendo ajustada".
De casa, Elton John e banda trouxeram, além dos monitoes, suas consoles Yamaha: uma PM5000 para Clive Franks operar o PA e uma PM1D para a mixagem dos monitores. Ainda na entrevista ao site da Yamaha, Alan Richardson explica o porquê da opção pela mesa: "Gosto muito da versatilidade da PM1D. Ela tem muitas entradas e saídas, uma porção de ferramentas e o recall, que é essencial", afirmou ele, acrescentando ainda que pouco usa periféricos.
Já James Blunt optou, segundo Peter Racy, por mesas analógicas e usou uma Midas Heritage H3000 no PA com diversos periféricos e uma Midas XL-4 no monitor com outros tantos periféricos. "É curioso, porque normalmente a posição deste par de mesas é invertida, com a XL-4 no PA", comenta o engenheiro da Gabisom. Curioso também que, como já havia acontecido no Tim Festival, por exemplo, mais uma vez um artista novo usa mesas analógicas, enquanto o veterano opta por digitais...
A PLENOS PULMÕES
Por falar em curiosidades, Peter conta que ficou impressionado com a potência vocal de Elton John, que costuma usar um Shure Beta 58. "Apesar de não estar tão novo, e de já ter tido complicações com a voz, ele hoje faz um show que gira em torno de duas horas e meia, ininterruptas, nas quais ele canta o tempo todo, e com emissão total. Ele canta muito forte, muito mesmo. É um esforço físico tremendo", afirma o técnico brasileiro.

De acordo com Peter, os monitores de voz do cantor inglês chegam a 121 dB nos ouvidos dele. No show da sala São Paulo, inclusive, esse aspecto isto chegou a ser um problema, pois, como explica o engenheiro, todo o som que era gerado no palco foi naturalmente - e conforme o projeto da sala, que foi desenhada para apresentações orquestrais acústicas) - propagado para toda a platéia. "Dessa maneira, o som do PA foi contaminado, prejudicando um bocado a mixagem e a qualidade do som", diz.
Já o áudio dos shows de James Blunt e Elton John na Apoteose foi bastante elogiado. Para Peter, um bom som começa com bom equipamento de PA. "Estas apresentações tiveram a honra de usar o sistema V-Dosc. Outros fatores importantes são uma boa banda com bons instrumentos, uma boa mixagem. E, é claro, um bom projeto de sonorização ajuda muito", explica.
De diferente em relação a outros shows que a Gabi fez na Apoteose, Peter destaca - além do V-Dosc, que nem sempre é utilizado - que o PA principal foi montado de forma a servir apenas à pista e à área vip ao fundo, enquanto os PAs laterais (delays) foram montados para servirem apenas às arquibancadas.
Para ele, o fato de trabalhar com um artista mais experiente, como Elton John, é, com certeza, um fator que facilita a interação e a qualidade da sonorização. "Elton John e banda são um time de veteranos que continuam muito na ativa, fazendo muitos shows a cada ano. A experiência fala por si própria. A equipe dele também só tem veterano. Eles são muito rápidos e profissionais", elogia.
Pela Gabi trabalharam nos shows uma dezena de técnicos: Renato, Peter, Valtinho, Lucas, Alê, Japa, Cardoso, Lira, Miguel e Felipe. O relacionamento com a equipe estrangeira foi muito bom, segundo Peter. "São pessoas finíssimas e não houve pedidos excêntricos", diz.
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Colaborou Tatiana Queiroz