Depois de rodar o país com a turnê de Reggae a Vida com Amor, CD de estréia que atingiu a marca de 50 mil cópias vendidas de forma independente e chegou a ser distribuído pela gravadora Deck Disc, o grupo carioca Ponto de Equilíbrio se prepara para retomar as atividades com um novo trabalho de estúdio.
Abre a janela, o segundo álbum de carreira do octeto, acaba de ser produzido e gravado no Estúdio 304, no Rio de Janeiro, por Chico Neves, que convidou o engenheiro de som Walter Costa para mixá-lo. A masterização será feita por Carlinhos Freitas, no Classic Master, em São Paulo.
De acordo com o guitarrista e produtor musical Ras André, que produziu Reggae a Vida com Amor, a sonoridade de raiz que consagrou o Ponto de Equilíbrio está presente nas novas músicas, assim como o conteúdo de suas letras, que sempre denunciaram as desigualdades sociais geradas pelo sistema capitalista, alertaram para um chamado espiritual de amor, verdade e justiça e buscaram a mobilização do povo na luta por seus direitos.
O músico revelou ainda que essa sonoridade foi fundida com outros ritmos, como o samba, o maracatu, a salsa, a capoeira de angola, o ijexá, o afro-beat, o ska e o rocksteady.
RAIZ INABALADA APESAR DE FUSÃO RÍTMICA
Ras André: Esse disco consolida a música que desenvolvemos ao longo de sete anos de estrada. Ele firma nossa identidade como banda brasileira de reggae raiz, que tem influências de vários ritmos de origem africana - entre eles, o samba, o maracatu, a salsa, a capoeira de angola, o ijexá, o afro-beat, o ska e o rocksteady - e nos aproxima ainda mais do dub, pois conta com instrumentais de tempero jazzístico e com uma atmosfera psicodélica.
Chico Neves: Foi muito bom fazer esse trabalho com o Ponto de Equilíbrio, pois trata-se de uma banda de reggae muito boa, que admiro bastante. O espírito roots de seu CD anterior foi mantido, mas, no atual, a sonoridade foi mais bem elaborada. Eu quis que tudo soasse grande, com um punch extra. Por isso, tive muito cuidado na hora de buscar os espaços para inserir vocais, metais e outros instrumentos. Na verdade, a dificuldade de produzir uma banda como essa, com diversos integrantes, é justamente lapidá-la sem condenar suas características naturais.
A VERDADEIRA IMPORTÂNCIA DO PRODUTOR
Ras André: Ao pensarmos em convidar alguém para assinar a produção desse disco, tivemos o cuidado de escolher um nome que respeitasse nossa identidade e, ao mesmo tempo, nos ajudasse a crescer. Assim chegamos ao Chico Neves, que, além de ser um dos maiores produtores em atividade no país, é um profissional bastante conceitual. Sua participação foi fundamental, pois fez com que mantivéssemos nossa sonoridade sem restringi-la ao universo do reggae. Foi ele quem nos deu força e segurança para sermos, ao mesmo tempo, roots e modernos.
Chico conseguiu organizar todas as nossas idéias e dar uma coesão muito boa para nosso som. Além de arrumar a casa, ele também contribuiu com arranjos e resoluções e nos deixou bem à vontade para gravar. Eu acho que o resultado de uma gravação é reflexo de seu ambiente, e lá no seu estúdio encontramos um ótimo lugar para soltar as idéias.
CAPTAÇÃO PRIMOROSA VALORIZA INSTRUMENTOS
Chico Neves: Para captar o bumbo da bateria, usei um microfone Beyer Opus 65, em seu interior, e um Neumann U47, afastado de sua pele de resposta. Os tons receberam os Sennheiser MD-504, enquanto o surdo ficou com um AKG SE300B. Para a caixa, usei um SM57. Os ambientes foram captados por um Neumann KU100, que é a cabeça estéreo de captação. Ele foi posicionada a 1 m da bateria. As guitarras foram ligadas em um amplificador Fender e captadas com os GFM 132, da Neumann. As vozes foram registradas com o Telefunken U47.
Além disso, no ambiente do bumbo, na caixa, nos tons, nos metais e no baixo, foram usados os pré-amplificadores Jensen. Nos microfones de ambiência da bateria, usei um pré Summit, enquanto no close mic do bumbo usei um pré Daking. No contratempo, nas guitarras e em algumas percussões foram usados os prés Studer.
Ras André: O som do disco foi muito bem tirado com vários dos microfones e prés valvulados que Chico tem e usa sem medo. O clima dub, que permeia todo o trabalho, com ambientes que remetem ao melhor da old school jamaicana, foi feito com câmaras de eco e com caixas Leslie.
Acho que o timbre de uma guitarra ligada em um amplificador valvulado é algo único. Já os efeitos têm que vir para dar o tempero certo, senão o som fica pasteurizado, como se fosse de plástico. Gosto muito de usar pedais, mas não uso pedaleiras digitais nem simuladores. Procuro sempre utilizar os efeitos analógicos, como delays, ecos, tremolos e filtros de vários tipos, como phaser e flanger. Tanto a saturação do amp quanto um booster (que uso como se fosse um pré, ligado em tempo integral) dão um toque de classe ao timbre. Já os drives do tipo Tube Screamer envenenam as guitarras mais pesadas.
SONORIDADE VINTAGE PARA REVERENCIAR BOB MARLEY
Ras André: Para Abre a janela, buscamos sonoridades características das décadas de 60 e 70. Por isso, usamos instrumentos vintage, como o Fender Jazz Bass, de 1976, e as guitarras Gibson Les Paul Studio, de 1982, Ibanez tipo Les Paul, lançada em 76, e Fender Telecaster, de 52, que é um dos meus xodós. Também usei uma semi-acústica Epiphone e um violão de aço da mesma marca, que pertencem ao Chico. Gravamos todas as guitarras no meu amplificador, um Fender Hot Rod Deville - valvulado com dois falantes de 12" e reverb de mola -, que tem punch e timbre imbatíveis, sons cristalinos, mas muito nervosos.
Usamos ainda uma bateria Pearl, percussões LP (congas, timbales, blocks e ketes), alguns tambores como alfaia e surdos, e teclados como o Nord Electro, que tem timbres sampleados de Piano Rhodes, Hammond e pianos acústicos, e o Korg M1, que é bastante usado em discos de reggae.
MIXAGEM DETALHADA PROMOVE AMBIÊNCIAS AO DISCO
Ras André: O principal cuidado que tivemos foi fazer com que o som do disco fosse limpo e claro. Walter Costa foi o engenheiro que Chico convocou para essa empreitada. Ele valorizou bem os timbres que foram gravados e criou atmosferas muito interessantes. Nós participamos ativamente, sugerindo alguns efeitos e onde utilizá-los, mas o grosso mesmo ficou por conta deles dois.
Chico Neves: Durante a mixagem, usei efeitos como delay em algumas guitarras e vozes. Esses efeitos enriqueceram as músicas e valorizaram certos momentos do disco. Não busquei nenhuma referência em especial. A sonoridade foi se definindo naturalmente, à medida que as músicas foram gravadas.
INDEPENDÊNCIA ACIMA DE TUDO
Ras André: Estreamos no mercado fonográfico com um CD independente. Somente depois de um ano e meio e de muitos discos vendidos é que fomos distribuí-lo por uma gravadora, a Deck Disc. No entanto, a companhia não fez um bom trabalho de divulgação. Além disso, o preço do produto quase duplicou (em comparação ao independente) e era difícil encontrá-lo nas lojas. O que aconteceu? Eles venderam menos que a gente.
Por essas e outras razões, resolvemos lançar Abre a janela por conta própria. Ofertas para lançá-lo por gravadoras não nos faltaram, mas não recebemos uma proposta que realmente valesse a pena. Atualmente, as majors querem receber porcentagem dos shows de seus artistas, pois alegam que a indústria está em crise, mas não querem se comprometer com nada. A gente vendeu mais de 50 mil cópias de forma independente, temos uma comunidade no Orkut com mais de 130 mil fãs, fazemos shows no Brasil inteiro e agora temos um disco assinado por ninguém menos que Chico Neves. Estamos muito bem acompanhados.