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Revista Luz & Cena
Lugar da Verdade
DE VOLTA PARA O FUTURO
Enrico De Paoli
Publicado em 28/05/2007 - 18h08
Sem dúvida nenhuma, toda essa revolução tecnológica que estamos vivendo é bem interessante. Quase tudo ficou mais prático, apesar de o making of ser bastante mais complexo. Digo "quase tudo", porque não posso deixar de lembrar do famoso sistema que se tornou o infeliz culpado de tudo o que ninguém quer assumir. Porém, tinha uma coisa que me assustava muito: estava sentindo o mundo cada vez mais descartável. Sou bastante tradicionalista e vejo muita beleza nas histórias das pessoas, empresas, marcas, produtos, etc. Durante algum tempo, me senti envelhecer por ser dono de uma idéia um pouco antiquada para os moldes atuais. Mas... ainda bem que eu não estava sozinho.

É de se esperar que tudo ande cada vez mais depressa. Afinal, a tecnologia ajuda inclusive a desenvolver as próximas (tecnologias). Mas parece que, depois da enxurrada de novidades, descobriram que estamos com saudades de como era tudo. ou quase tudo. Podemos deixar algumas coisas de fora dessas saudades, como o Adat-engole-fitas!

Parece que, depois da guerra dos computadores, estamos chegando a um acordo entre Macs e PCs. Ao menos, a maioria dos poucos softwares que se tornaram padrão da indústria, rodam nas duas plataformas. Os principais programas além do universo musical também. Mas talvez o mais importante ainda: as UI (interfaces do usuário) estão bem parecidas. Os plug-ins também existem para ambas as plataformas. E não só isso... Podemos usar os mesmos plug-ins em uma variedade de softwares. Isso faz realmente nosso subconsciente enxergar plug-ins bem mais como periféricos do que como parte de um software.

E, por falar nisso, temos que contemplar que os plug-ins estão realmente com almas reais. Não apenas os timbres, mas as fisionomias deles são sensacionais. A Waves, por exemplo, tem mantido o evoluir de suas caras bem tradicionalmente. Todo mundo já sabe como funciona um Waves. Mesmo quem não tem. Sou capaz de dizer que eles mudaram menos suas caras e interfaces nos últimos dez anos do que a vasta maioria de fabricantes de mesa digitais (que não são virtuais). A Bomb-Factory dispensa comentários. Além da recriação de timbres que viraram eternos, eles realmente estão pensando tradicionalmente. Mixar em um sistema virtual, hoje, é bem parecido com antigamente. Digo, mexemos nos mesmos botões. Olhamos para várias das mesmas caras.

Vamos deixar para trás um pouco o fazer música e partir para a outra ponta, que obviamente tem muito mais adeptos, os que ouvem música. Como disse no início do papo, apesar das facilidades, me assustava o pouco caso com os discos que o movimento MP3 causou. Ninguém parece mais ter álbuns. Os celulares baixam músicas avulsas. E a pirataria, obviamente, também. Cadê as fichas técnicas, as fotos, as artes-gráficas? Cadê aquela sensação romântica de ouvir o novo disco de algum artista de que gostamos?

Pois é... Quem baixou a última versão do iTunes (www.apple.com/itunes) pode voltar a ter uma coleção de discos. E não mais aquele monte de arquivos MP3 perdidos no HD do computador. Steve Jobs, presidente da Apple Inc., parece também ter uma certa nostalgia. A nova versão do software permite que você organize seus arquivos com capas de discos que você joga pra um lado ou outro, literalmente como se estivesse folheando sua coleção de long-plays em uma prateleira de estante. E essas capas ainda aparecem nos iPods, que já ultrapassaram 100 milhões de unidades vendidas. Você poderá ainda facilmente baixar da web as capas que não tem e, mais facilmente ainda, anexar aos seus arquivos. É uma besteira? Talvez tanto quanto os Bomb-Factories. Mas não tem quem não goste. Afinal, não é fácil reprogramar nossas mentes e hábitos do zero, cada vez que surge algo novo.

Agora tive a sensação de estar de volta ao futuro, com toda a saudosa tradição do passado. Quem sabe o próximo resgate do baú não seja o saudável hábito de comercializar bons discos, inteiros, com seqüências musicais e histórias coerentes a preços, digamos, divertidos. Parece que o iTunes Music Store está indo bastante bem nos países em que atua. Ainda que os discos não mais existam no plano real, o serviço de resgate da tradição está seguindo um belo caminho.


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Enrico De Paoli
é engenheiro de áudio. Atualmente mixa e masteriza em seu Incrível Mundo Studio. Projetos recentes incluem Max Viana, Stanley Jordan, Manoel Tchembo, Titi Walter, Flávio Medeiros, entre outros.
cartas@enricodepaoli.com. www.EnricoDePaoli.com
 
Conteúdo aberto a todos os leitores.