O Xangô de Baker Street
Som Direto do Filme Adaptado do Livro de Jô Soares
André Luiz Mello
Publicado em 01/04/1999 - 00h00
Num domingo ensolarado do mês de dezembro do ano passado, estivemos numa das principais locações - o pátio da antiga Casa da Moeda (RJ) - do filme "O Xangô de Baker Street", originado do best-seller de Jô Soares. Dirigido por Miguel Faria Jr., a película teve um orçamento de R$ 6 milhões - uma grande produção para os padrões nacionais - e o ator português Joaquim de Almeida como Sherlock Holmes, além de Marco Nanini (delegado Melo Pimenta) e o próprio autor numa pequena participação. A captação do som direto ficou aos cuidados do técnico Jorge Saldanha e de seus dois filhos, Ian (cable man) e George (microfonista).
Com 47 anos de idade e 22 anos de profissão, Jorge trabalhou em "La-marca", para a BBC de Londres e terminou a entrevista com um cálculo bem interessante: a soma da carga horária dos 43 filmes em que participou resulta em sete anos ininterruptos nos sets de filmagem. Acompanhe a sua entrevista.
A Pré Produção
Para dimensionar com precisão o equipamento que seria utilizado na captação de som, Jorge Saldanha visitou a maioria das locações previstas no cronograma do filme. Na Casa da Marquesa de Santos (RJ), por exemplo, se fez necessário fechar o trânsito nas ruas próximas e aplicar mantas de algodão em alguns ambientes.
Estúdio Móvel Foi Montado Para as Externas
Uma das principais locações do filme, a antiga Casa da Moeda, próxima à Central do Brasil (RJ), motivou o técnico de som a montar um simplificado estúdio móvel no interior de um caminhão, e tratado acusticamente. Saldanha tomou esta decisão porque existem apenas duas saídas para refazer os diálogos que não são bem captados ou imperfeitos: na própria locação é improvisado uma isolação acústica (com mantas) para que o ator possa dublar as falas ou então este processo é feito num estúdio, o que não garante total fidelidade, pois terminada a filmagem o ator já começa se envolver em outros projetos.
Com a unidade móvel, a tarefa de gravar e dublar na locação tornou-se mais fácil. Nele, o ator assistia a uma cópia da cena em VHS (num monitor de 30") e refazia a fala. Foram instalados dois videocassetes: um, gravando direto do set de filmagem, e outro para registrar a dublagem que seria feita no caminhão. Os dois canais da fita VHS foram divididos da seguinte maneira: um com o som direto e outro, com a dublagem. Desta maneira, o diretor do filme poderia conferir a dublagem no mesmo dia e checar se o trabalho foi bem feito.
Para evitar problemas de sincronismo, o mesmo time code da cena foi usado na dublagem. Além disso, na dublagem é utilizado o mesmo microfone da cena para que não haja mudança no som. Outra vantagem do estúdio móvel é que nele um técnico (Bito Cavalcante) ficava responsável por operar o gravador DAT como backup, que estava recebendo o áudio do set up de Jorge Saldanha, através de um multicabo de 150 metros.
Cavalos Usaram Ferraduras de Borracha Para Evitar Ruídos
Indagado sobre as maiores dificuldades encontradas e quais as soluções encontradas, Jorge Saldanha respondeu: "Esse filme é passado em 1886, então não posso aceitar nenhum ruído que não seja da época. A primeira dificuldade foi em Portugal, com os cavalos, mas a gente bolou uma ferradura de borracha. As rodas das carroças também são revestidas de borracha para não fazerem barulho. Hoje as pessoas tiveram que tirar os sapatos para andar na calçada porque as pedrinhas geram um ruído bem agudo, na gama da freqüência da voz. É uma forma mais rápida de solucionar o problema. Se eu for cortar isso depois na equalização, estrago a voz dos atores", explica.
Um outro macete - desta vez de caráter visual - foi a fixação de um pedaço de fita laranja na ponta da espuma (Windscreen) do microfone shotgun. Assim, qualquer interferência do microfone no enquadramento seria rapidamente perceptível pelo câmera.
Um procedimento bastante curioso do técnico é que após o diretor pronunciar o "corta!", Saldanha continuava a gravar - e o set permanecia em silêncio - durante mais uns 30 segundos. "Sempre me fazem essa pergunta. Normalmente numa seqüência da locação você também grava o som ambiente. Tem o vento e o barulho das folhas, daqui a pouco pára e tem outro ambiente. Os silêncios são diferentes a cada momento. Não existe um silêncio igual a outro, a não ser em estúdio. A gente consegue disciplinar a equipe e a cada vez que termina a cena, fico uns 15 ou 30 segundos suficientes para gravar esse silêncio, que poderá ser usado na edição", explica.
Ele cita o exemplo de uma cena na qual duas pessoas conversam. O rosto do primeiro ator é filmado às dez da manhã e o do outro ator, ao meio-dia. "A solução é ter os dois silêncios para misturá-los na edição", completa.
Os Microfones Ideais
Como microfones, ele prefere os Sennheiser 416 (shotgun) e Neumann 184, e os de lapela (Lectrosonics) são usados em último caso, pois, segundo ele, estes não têm dinâmica. "Se o cara muda de posição o som é o mesmo, e a verdade não é essa. Conforme a pessoa anda, o som se comporta de uma maneira. O microfone boom é o som ideal", argumenta. No caso de uma cena em que se tenha muito teto (teto é o espaço entre a cabeça do ator e o canto superior do enquadramento) o de lapela é indicado, pois é extremamente pequeno.
Jorge Saldanha fala da importância de se compilar, como num relatório, todas as informações detalhadas referentes à captação de som, que são anotadas a cada dia de filmagem. Na pós produção estas informações serão entregues ao editor de som direto. "Meus relatórios são lindos, eu faço no computador. Depois que passei a fazer isso, não recebi telefonema de nenhum editor de som para perguntar nada", conta entusiasmado.
Relação de Equipamento
Som Direto do Filme "O Xangô de Baker Street"
Gravadores
DAT Fostex PD-4
DAT Sony TCD-D8
Nagra IV-S
Mixer
PSC M-4
Microfones
Sennheiser MKH 416 P-48
Sennheiser MKH 416 T
Beyer M88N
PSC Millimike
Neumann KM 184 P-48
Lectrosonics
Receptores
Lectrosonics CR-187
Lectrosonics CR-185
Transmissores
Lectrosonics M-187
Lectrosonics M-185
Headphones
4 Sony MDR-7506
Sony MDR-V7
Sennheiser HD 25 SPO
3 JVC
Windscreens (espumas)
3 Rycote
3 Zepellin MZW 60-1
3 suportes para zepellin
Claquete
Decode TS-1 Denecke
Booms (varas)
Beyer
Usaconnic
Connic
Rádio transmissores
2 Comtek M-72
Rádio receptores
7 Comtek PR72-B
Monitores de vídeo
Sony 30"
Sony 14"
Videocassetes
2 Sony
Caixas de som amplificadas
2 PRC 360
Outros
Power supply AD-15
Carregador de baterias Anton Bauer LSNP
Baterias Anton Bauer NP-13 plus
Monitor Philtron SW-5000KR
150 metros de multicabo (10 vias)